O que a equipe do Terraço leu de bom em 2016?

As férias chegaram, finalmente. É hora de digerir esse 2016, um ano de muitos acontecimentos. E quem disse que as férias de fim de ano são só pra comer (ou pavê), piadas ruins a parte, é momento de por a leitura em dia! E para te ajudar a escolher o que levar pra ler nas férias, fizemos a lista dos livros que a nossa equipe mais gostou em 2016.

Ps: todas a recomendações foram escritas pelos próprios membros e expressam as opiniões dos mesmos.

VICTOR CÂNDIDO

  • The Courage to Act – Ben Bernanke O homem que guiou o FED, o Banco Central americano, durante a crise de 2007/08, discute suas memórias e analisa todos passos tomados para conter a maior crise financeira desde 1929. O livro é bem interessante, pois é um exercício de reconhecimento dos limites de um policymaker e também de como a política monetária precisou ser rediscutida de forma bastante ampla para a solução da crise. Bernanke desenhou os programas de afrouxamento quantitativo, ou quantitativing easing, que foram decisivos para a recuperação da economia americana. Se você quiser ler apenas um livro sobre economia nas férias, recomendo esse catatal de 600 páginas.
  • The Wright Brothers – David McMcullough Automaticamente todos vão dizer: que mané irmãos Wright, aqui é Santos Dumont. Esse livro tira o mito dos irmãos e os analisa de uma forma ímpar. E infelizmente, sim, eles voaram antes do nosso Santos Dumont. Inclusive no ano que St. Dumont voou o 14 bis, os irmãos Wright já tinham um avião que decolava normalmente. O interessante da história deles, é a vontade de criar uma máquina que imitasse os pássaros. Wilbur e Orville Wright estudaram até o ensino médio, eram modestos, aprenderam tudo sozinhos. Possuiam um pequeno negócio de produção de bicicletas, onde aprenderam as habilidades mecânicas necessárias para construir seu primeiro avião, o histórico Flyer. Uma passagem interessante é quando eles precisam comprar um motor para o avião e nenhuma fabricante se habilita a vender, os próprios decidem produzir seu motor, mais leve e de alumínio, uma inovação para época, tudo isso sem nunca antes terem colocado as mãos em um motor. Leitura mais que recomendada. 

CAIO AUGUSTO

  • Os números (não) mentem – Charles Seife. A profissão de economista demanda que sempre tenhamos à mente provas do que estamos falando – e, na maioria dos casos, coloca-se como preferencialmente que estes dados sejam numéricos. Contra o senso comum, este livro mostra que existem diversos truques matemáticos que moldam mensagens. No fundo, o livro é um lembrete importante: é sempre sadio manter o ceticismo e procurar entender as razões dos eventos econômicos, porque ter os dados sozinhos – ou montar correlações espúrias, como alguns economistas costumam fazer – não irá fazer sua explicação ser mais convincente.
  • Cartas a um jovem economista – Gustavo H. B. Franco. Um livro que discute temáticas quase atemporais dentro da economia, servindo para orientar quem pretende se encaminhar por esta área no ensino superior e levantar questionamentos diretos a quem já está na área há algum tempo. O autor dispensa maiores apresentações e viveu o que narra, o que torna a leitura ainda mais interessante. Se você gosta da discussão econômica mas tem dúvidas sobre se encaixar ou não neste campo, o segundo capítulo é um excelente tira-teima.

PEDRO LULA MOTA

  • A alquimia das finanças, Lendo a mente do mercado – Georges Soros. O livro é uma especie de diário do grande especulador e filantropo George Soros, escrito após o episódio em que ficou mundialmente famoso ao apostar contra o banco central britânico (e a libra), acertar e quase quebrar a instituição. A linguagem é simples e didática, em que Soros demonstra o dia a dia de suas posições em seu hedge fund, desenvolve a teoria que batiza de “teoria de reflexividade”, evidencias as limitações das premissas de mercado e faz duras criticas ao sistema – apesar de ser um dos seus maiores expoentes. 
  • Sociedade com custo marginal zero – Jeremy Rifkin. O autor elenca uma grande quantidade de dados e exemplos para sustentar sua tese de que: as novas tecnologias estão quebrando paradigmas e patrocinando o florescer de uma novo sistema econômico, que pode ser considerado um novo capitalismo ou um rompimento com o mesmo. Rifkin explica como a Internet das Coisas em conjunto com as tecnologias de energia e transportes estão alcançando grau gigantesco de interconexão, elevando a produtividade dos processos, solapando o custo marginal e compartilhando os benefícios entre todos os usuários dessa grande rede. Como resultado, o lucro passa a ter um papel secundário. Leitura obrigatória para compreender as mudanças recentes em nossa sociedade.

ARTHUR LULA MOTA

  • Central banking in theory and practice – Alan S. Blinder. O livro é uma compilação de palestras na LSE (London School of Economics) cujo objetivo é contar como é a “vida” de um banqueiro central. Une a experiência acadêmica e prática de um homem que foi vice chairman do Fed (Banco Central Americano) na Era Greenspan. Trata da variedade de complicações que um dirigente de banco central precisa enfrentar na tentativa de implementar, na pratica, a abordagem clássica de metas e instrumentos. Descreve como foi o início da utilização dos modelos para a política monetária, algo que hoje é básico para nós. Na época, ele os defendia como guia, mas com um certo ceticismo. Outro debate importante do livro, e que recentemente nos visitou, é a importância do Banco Central independente.
  • O desafio brasileiro – Ensaios sobre desenvolvimento, globalização e moeda – Gustavo H. B. Franco.Um clássico, escrito por uma lenda. Um dos heróis do Plano Real, Gustavo Franco descreve com maestria o debate em relação as diversas visões de como se estabelece o desenvolvimento, abertura comercial e o combate a busca pela moeda sadia (fim da hiperinflação). Seu sarcasmo já muito conhecido tomou a melhor forma neste livro, sobretudo ao tratar da escola Inflacionista do espectro do pensamento econômico

LEONARDO PALHUCA

  • Economic Facts and Fallacies – Thomas Sowell. Basicamente sobre como alguns fatos podem ser mais bem explicados com rigor econômico mais apurado e como políticas podem ser enganosas a priori, mesmo que com boas intenções. Exemplo clássico do livro: problema de moradia em cidades americanas que tentaram resolver com regulação errada. Resultado: maior déficit habitacional e maior preço de aluguel.
  • Ludwig Erhard: a biography – Alfred C. Mierzejewski. Biografia do ministro das finanças da Alemanha no pós-guerra, durante o governo Adenauer. Foi o responsável pela liberalização dos mercados na Alemanha, tnato de bens quanto de fatores, indo contra as recomendações dos Aliados de ter uma economia mais controlada, como na França. Co-responsável pelo milagre alemão, foi primeiro-ministro por um breve período depois do Adenauer, mas não era muito político. Era bem técnico e as ideias e políticas dele foram responsáveis por colocar a Alemanha onde está hoje. E ele ainda fumava durante entrevistas.

RACHEL DE SÁ

  • Trópicos utópicos – Eduardo Giannetti. Uma espécie de apanhado de divagações do cientista social e economista, o livro trata desde questões de cunho histórico-filosófico como a proximidade de política e religião ao longo dos séculos, quanto de tecnicalidades do debate econômico atual como padrões de desenvolvimento e sustentabilidade. De leitura leve apesar da densidade dos assuntos, o livro traz um olhar diferente ao indagar o que devemos desejar e esperar do Brasil como economia e país de incrível multiplicidade étnica e cultural.
  • Temos extremos – Míriam LeitãoRomance de estréia da jornalista econômica Míriam Leitão. A história se passa em uma fazenda mineira, na verdade duas histórias, que se conectam por essa fazenda. A primeira é sobre uma família que sofreu muito com a ditadura militar e vai para a fazenda comemorar o aniversário da matriarca. Enquanto a segunda história é sobre dois irmãos, escravos, que viviam na fazenda e que lutavam contra a escrivadão. Como as histórias se conectam? Não vou falar, leia o livro, vale a pena. 

LEONARDO SIQUEIRA

  • A Riqueza das nações no século XXI – Bernardo Guimarães. O livro aborda questões econômica de uma maneira racional e sem se deixar tentar por apelos políticos. Questões como deveria o BNDES emprestar tanto como empresta a juros subsidiados, lei do conteúdo local de fato impulsiona uma economia,entre outras são respondidas. Bernardo, faz um livro muito simples e didática, capaz de ser lido em 15 dias. A leitura é prazerosa e enriquecedora de como raciocinar economicamente.
  • O fator Churchill – Boris JohnsonQuando Boris escreveu este livro era apenas um Jornalista entusiasmado. Hoje ele é ex-prefeito de Londres e chanceler das relações exteriores britânicas. Gosto do Livro por mostrar – ao contrário do que muitos pensam – que Churchill foi um desacreditado a vida inteira. Seu próprio pai foi um dos que acharam que ele não seria ninguém na vida. Não só desacreditado, Churchill em mais de uma vez na carreira foi colocado no Limbo, como quando comandou a operação de Galipoli e perdeu de maneira vergonhosa. Mas Churchill se reinventava, começou a se expor em rodas que as pessoas o ouviam e se tornou num dos maiores – senão o maior – líder da Inglaterra moderna.

ARTHUR SOLOW

  • Como matar a borboleta azul: Uma crônica da era Dilma – Monica B. de Bolle. O livro mostra a linha do tempo do governo Dilma, desde o início, no qual a Presidente usufruía de amplo apoio popular, aproveitando a carona de seu padrinho político (Lula), até o momento mais dramático de sua passagem na presidência com o afastamento e posterior confirmação do Impeachment. Uma crise política e econômica dessa magnitude não surge da noite pro dia; pelo contrário, como é mostrado no livro que mistura dados econômicos, literatura popular e uma dose de sarcasmo, as políticas adotadas foram as responsáveis pela situação que vivenciamos atualmente.
  • Sonho Grande – Cristiane Correa. A história de sucesso de Jorge Paulo Lehman, e seus fiéis escudeiros Marcel Telles e Beto Sicupira é interessante do início ao fim. De uma promissora carreira no tênis até a formação da maior cervejaria do mundo, Lehman soube como poucos delegar funções e responsabilidades para aumentar seu próprio patrimônio. Seu trabalho, na maioria das vezes, foi resgatar empresas que não apresentavam bons resultados e transformá-las em exemplo de gestão e lucratividade. E, claro, com uma pitada de sorte no meio do caminho; embora, no todo, o esforço e a dedicação dessas três figuras do empreendedorismo tenham contado muito mais.

TALITHA SPERANZA

  • Condições de Liberdade – Ernest Gellner. Neste livro denso e original, Ernest Gellner demonstra que a grande diferença entre as ideologias totalitárias e o liberalismo ocidental é a existência da sociedade civil – idéia que nos ajuda a entender como uma determinada sociedade funciona de fato, e como difere das formas alternativas de organização social. Além disso, mostra a influência do islamismo no mundo contemporâneo, sustentando que o fracasso do marxismo foi um dos fatores que propiciou o fortalecimento progressivo do Islã.
  • Por que as nações fracassam – Daron Acemoglu e James RobinsonPor meio de um texto instigante, Por que as nações fracassam responde à pergunta que há séculos instiga diversos estudiosos: por que algumas nações são ricas e outras são pobres, divididas por riqueza e pobreza, saúde e doença, comida e fome? Neste livro, Daron Acemoglu e James Robinson tratam das diferenças abissais de receita e padrão de vida que separam os países ricos do mundo, como Estados Unidos, Reino Unido e Alemanha, dos pobres, como os da África subsaariana, América Central e do Sul da Ásia; Os autores fazem uma demonstração cabal de que são as instituições políticas e econômicas que estão por trás do êxito econômico (ou da falta dele). Trata-se de uma leitura que oferece um vastíssimo leque de exemplos históricos para demonstrar como mudanças podem contribuir para instituições favoráveis, inovações progressistas e êxito econômico ou, ao contrário, para instituições repressoras e, em última instância, decadência ou estagnação.

 

 – Post colaborativo publicado no Terraço Econômico em 15/12/2016: http://terracoeconomico.com.br/o-que-equipe-do-terraco-leu-de-bom-em-2016

Sobre a quase-alteração do BC que poderia acabar com o Nubank

Um dos momentos mais tensos como economista pra mim até agora foi o de avaliar o possível saldo da decisão do BC de mudar o prazo máximo de repasse das operadoras de cartão de crédito de 30 para dois dias. Por um lado, uma inovação muito interessante – o Nubank Brasil – poderia deixar de existir; por outro, ganhariam os agentes prestadores de serviços menores, que poderiam aumentar suas possibilidades de pagamento sem ter problemas graves no fluxo de caixa (afinal, como ontem ouvi e concordei, “o taxista tem que abastecer o carro amanhã, não daqui 30 dias”). De qualquer modo, acredito que toda decisão que ocorra sem um estudo prévio de custo-benefício, avaliando o que se perde e o que se ganha quando de uma mudança legal, traz consigo uma insatisfação daqueles que se surpreendem com tal decisão.

Felizmente, o Banco Central do Brasil mostrou que veio não para fornecer choques, mas para evitá-los: a decisão foi de avaliar as possíveis mudanças junto aos operadores de cartão de crédito e não encurtar o prazo simplesmente sem uma consulta de como funcionaria este processo na prática. Decisão que fica, a meu ver, mais acertada do que simplesmente acertar uma mudança legal e esperar que as coisas todas se resolvam magicamente.

O que espero que venha por aí: uma adaptação dos operadores de cartão de crédito para que este meio de pagamento encurte seus prazos – quem sabe daí surjam inovações como o desconto por antecipação de pagamento, tal qual o Nubank faz atualmente – e um encurtamento real dos mesmos – para beneficiar os agentes da economia.

O diálogo entre as partes tende a resolver melhor as situações porque, via de regra, a ideia de que as leis podem por si só e automaticamente moverem o comportamento econômico não tem tanta aplicabilidade real quanto se imagina.

Por Caio Augusto | Editor do Terraço Econômico

 – Escrito e publicado na página do Terraço Econômico em 20/12/2016: https://www.facebook.com/terracoeconomico/posts/1400030463381093?pnref=story

Não existem economistas bonzinhos ou malvados: a diferença está no método

Ultimamente, no Fla-Flu político e econômico, muita gente tem a impressão que existem duas castas de economistas. A primeira é formada pelos economistas “malvados”, aqueles que defendem a contenção de gastos do governo – e consequentemente a PEC do Teto dos Gastos, aprovada no Senado, assim como também defendem a Reforma de Previdência. A segunda seria caracterizada pelos chamados economistas “bonzinhos”, que criticam o controle dos gastos públicos assim como bradam sem rodeios que a Reforma da Previdência é inconstitucional e os direitos adquiridos pela sociedade não merecem ser debatidos e alvos de reforma neste momento – por mais que a proposta enviada pelo governo recentemente não inclua nenhuma alteração dos direitos adquiridos, se seguirmos a letra da lei sobre o que estes significam.

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Encontre os bonzinhos e os malvados na foto acima.

Notem, leitores, que essa visão não auxilia em nada o debate do presente momento. Quando falamos em economia (obviamente sem restringir suas sinergias com a política), não devemos acreditar na retórica segundo a qual existem aqueles que são “os malvados da história”, simplesmente pelo fato de mostrarem a verdade dos fatos. Sim, porque a verdade é dura demais. Mas, então, o que vale mais: mostrar a real situação das contas públicas e ser rotulado de neoliberal, rentista e elitista ou esconder o jogo e fingir que está tudo bem?

O ponto é inequívoco: os dados mostram como os gastos públicos seguem uma trajetória ascendente – tendo inclusive superado as receitas recentemente – e, quando as receitas caíram devido à crise econômica, essas despesas do governo não caíram na mesma velocidade () [1]. Na mesma toada, como a previdência social corresponde a boa parte do gasto total do governo brasileiro [2], uma reforma também seria necessária, haja vista a limitação do gasto real aprovada pela PEC. Você pode encontrar muitos desses artigos aqui no ou em outros blogs/sites de economia.

Algo que precisa ficar claro é que, independente da visão que você tenha, é sempre salutar acompanhar o que ocorre do outro lado do debate – por motivos claros: para verificar se o que lhe parece óbvio realmente o é e também para provocar em sua própria mente a reflexão que uma ciência social como a economia demanda.

Esse costuma ser outro divisor de águas entre os economistas ditos bonzinhos e os malvados: o método de análise. Há economistas que utilizam métodos científicos para averiguar se uma premissa é verdadeira, enquanto outras preferem a análise histórica do problema. É exatamente neste ponto que vale a pena uma reflexão importante: é mais válido ficar apenas com os dados ou somente com as suposições? A ideia de acompanhar o debate econômico é justamente poder formar alguma opinião observando os dois – quando não múltiplos – lados.

Outro ponto importante a se pensar é que, mesmo ao tratar-se de um debate direto entre ideias bastante diferentes podemos encontrar algumas razoáveis e outras que parecem não ter nenhuma conexão com a realidade; afinal, todos os economistas sérios apresentam suas ideias visando o melhor para a economia e a sociedade. Podem ser desde ideias de restrição dos gastos públicos até outras de ampliação destes, mas o objetivo é o mesmo: de melhorar a economia. É muito difícil encontrar um economista sério que diga “e penso em tais medidas porque elas complicam a vida de todos e pioram a economia”.

Algo que pode ajudar nessa formação de opinião sobre o andamento da economia é uma análise histórica do que já ocorreu dentro de um país. Por exemplo: nos anos 1980 tivemos no Brasil uma quantidade considerável de experimentos econômicos heterodoxos que buscavam encontrar uma solução aos problemas, dentre eles, o congelamento de preços – que resultou em menor acesso a produtos e, em vez de resolver o problema, apenas o aumentou. Por algum motivo, decidiu-se nos últimos anos repetir a experiência com os preços dos combustíveis e da energia elétrica e, adivinhem? Os resultados foram análogos: preços maiores e outras jabuticabas.

Toda dicotomia direta – bem e mal, ótimo ou péssimo, heterodoxia pura ou ortodoxia ao máximo – mostra extremos que não necessariamente são saudáveis. Lembremo-nos, por exemplo, que o Programa Bolsa Família foi modelado por um economista tido como liberal e de formação conhecida como ortodoxa (Ricardo Paes de Barros). De maneira análoga, as medidas de ampliação do crédito no pós-crise de 2008 realmente fizeram o Brasil sofrer menos com a crise do que muitos outros países do mundo (ao menos naquela ) – isso sem falar em outras medidas como a lei de falências e a criação do crédito consignado, também desenvolvidos por economistas tidos como liberais durante o governo Lula.

Por fim, é preciso estar atento e manter o ceticismo sobre economistas que tenham muito mais certezas do que dúvidas, pois a economia é uma ciência social sem respostas fechadas. Ou melhor, como diria o gênio Millôr Fernandes:

“Se você não tem dúvidas, é porque está mal informado…”

Arthur Solow – Editor Terraço Econômico

Caio Augusto – Editor Terraço Econômico

Notas

[1] https://www.nexojornal.com.br/grafico/2016/10/26/As-receitas-e-despesas-do-governo-federal-desde-1997

[2] http://www.valor.com.br/brasil/mosaico-orcamentario

 

Publicações deste artigo, que foi escrito em dezembro de 2016:

– Terraço Econômico (20/12/2016): http://terracoeconomico.com.br/nao-existem-economistas-bonzinhos-ou-malvados-diferenca-esta-no-metodo 

– ADVFN Brasil (20/12/2016): http://br.advfn.com/jornal/2016/12/nao-existem-economistas-bonzinhos-ou-malvados-a-diferenca-esta-no-metodo

– Money Times (04/01/2017): https://www.moneytimes.com.br/nao-existem-economistas-bonzinhos-ou-malvados-diferenca-esta-no-metodo

Não podemos confundir o “fora Temer” com o fim das reformas que estão ocorrendo

Recentemente começaram a ser divulgados trechos da delação mais aguardada – e recheada – de nomes: a de executivos da Odebrecht. Mostrando que não há preconceito algum com sigla partidária, temos lá demonstrados valores a praticamente todos os partidos existentes. Um nome também aparece associado ao recebimento de alguns milhões (e algumas dezenas de vezes): o de Michel Temer. Naturalmente, o efeito disso é um aumento sensível de sua impopularidade perante a sociedade.

Junto com este aumento de impopularidade há algo curioso: muitas pessoas estão associando a imagem de Temer às propostas levantadas por sua equipe econômica para o encaminhamento da crise fiscal brasileira – como a reforma previdenciária e a limitação real de gastos públicos nos próximos 20 anos. Precisamos dissociar as coisas, por um simples motivo: com Temer ou sem ele, a crise brasileira continua e a não discussão de possíveis soluções (no caso, envolvendo a redução de gastos pra fazer o orçamento caber nas receitas) é incapaz de resolver os problemas, por motivos óbvios.

Temer está conseguindo unir cada vez mais o Brasil – contra ele mesmo.

Mas não se engane: comprar a ideia de que “se ele sair tem de levar as reformas junto” não faz muito sentido, uma vez que os problemas seguirão existindo. Se o erro é político, deve ser resolvido com meios políticos – aliás, é justamente por isso que as expectativas econômicas deram uma aliviada após o impeachment de Dilma Rousseff: a possibilidade de realizar reformas que aliviem o problema fiscal brasileiro aumentou. Independente de ficar Temer ou não, as reformas econômicas devem seguir adiante.

Por Caio Augusto | Editor do Terraço Econômico

 

 – Escrito e publicado na página do Terraço Econômico em 11/12/2016: https://www.facebook.com/terracoeconomico/posts/1388369221213884 

Sejamos sinceros: é melhor nem pensar mais em aposentadoria

A bola da vez em nosso país é a famigerada reforma da previdência. Muito se fala sobre ela, sobre sua potencialidade de aliviar as questões fiscais brasileiras no longo prazo e também sobre os efeitos perversos de prolongar o momento de aposentadoria – diversos debates podem ser encontrados [1]. De fato, 65 anos como idade mínima parece ser uma grande injustiça com quem trabalha durante toda uma vida. Porém, será que já paramos para pensar sobre o tamanho de injustiça que se comete no sistema atual com as gerações que estão por vir?

A idade média de idade de aposentadoria no Brasil fica abaixo da média dos países da OCDE, enquanto o tempo médio em anos que um indivíduo fica aposentado está entre os maiores:

idades-de-aposentadoria

Com o aumento da expectativa de vida, é lógico imaginar que a proporção de tempo que vai se passar dependendo do sistema previdenciário é cada vez maior, caso a idade de aposentadoria não se altere. É exatamente isso que tem ocorrido nos dias atuais.

Como o sistema pay as you go – o meio em que a previdência funciona atualmente: os indivíduos que estão trabalhando transferem recursos aos que já se aposentaram – apresenta cada vez menos sustentabilidade, a alternativa se dá pelo aumento de receitas (aumentando impostos) ou pelo aumento de endividamento público. Nossa carga tributária já impõe consideráveis obstáculos ao setor produtivo – mesmo sem oferecer em contrapartida serviços públicos que sejam considerados adequados por grande parte da população [2] – e o endividamento está todos os dias em ascensão, o que também não passa como novidade aos olhos atentos de quem acompanha o noticiário econômico.

Três perguntas com respostas diretas sobre esta questão: qual o efeito disso, no fim das contas? Como as pessoas são afetadas? Por que fazer uma reforma que afeta o oferecimento de um direito fundamental e constitucionalmente estabelecido?

  • O efeito de se alcançar o esgotamento das possibilidades de orçamento e endividamento está sendo sentido neste momento por alguns estados que declararam calamidade financeira recentemente. Para ser um pouco mais direto: o Rio de Janeiro declarou que está parcelando salários de quase 40% dos servidores públicos [3];
  • As pessoas são afetadas diretamente por meio da redução do oferecimento de serviços [4]: em prol do pagamento de salários e aposentadorias – que, por serem gastos sustentados, têm prioridade e não podem simplesmente deixar de ocorrer – menos recursos podem ser destinados para a manutenção de hospitais e de escolas;
  • Porque não há a possibilidade – nem agora, muito menos no tempo futuro – de que os recursos sejam sustentáveis para que todas as estruturas de gastos coexistam (ao menos não do modo que ocorrem, em aumentos constantes e independentes da demanda social), dado que, com a diminuição de novos entrantes no mercado de trabalho, a continuidade do sistema atual é cada vez menos possível.

Com base nestes aspectos levantados e na triste constatação de que mesmo reformas altamente impopulares – como o teto dos gastos [5] e a reforma previdenciária [6] – sejam necessárias e ainda assim não suficientes por si só para resolver a delicada questão fiscal brasileira, a recomendação para quem ainda não está nas proximidades de se aposentar (pelo regime atual ou mesmo pelos 65 anos mínimos) e nem na regra de transição anunciada na proposta do governo [7] é a de que comece imediatamente a procurar outras maneiras de prover para seu futuro.

Parece brusco demais apresentar este fato, e simplista em demasia. Mas, apesar de inconveniente, é uma verdade: se em pleno ano de 2016, antes da inversão demográfica que se aproxima – ou, melhor dizendo, a diminuição e consequente reversão de nosso bônus demográfico [8] – já se espera que a situação fiscal comece a melhorar (mesmo com as reformas ocorrendo e o cenário econômico melhorando) nos próximos cinco anos, imagine qual será a situação caso elas não sejam aprovadas e o cenário seja o mais provável, como estaremos daqui a dez anos?

A sinceridade sobre esta sugestão que faço pode assustar algumas pessoas, que irão ler e bradar que este que escreve agora não sabe do que fala e defende o fim de alguns direitos. Curiosamente, me posiciono do outro lado da mesa: no grupo de pessoas que, diferentemente dos demagogos que afirmam que “todo gasto é prioridade” (“saúde é prioridade”, “educação é prioridade”, “emprego é prioridade”…), acredita que os gastos públicos devem ser concentrados na porção social que mais precisa deles – nas classes sociais mais desfavorecidas, com programas como o Bolsa Família [9], e não ajudando a manter ricos aqueles que já o são [10] – e que sua aplicação deve sim levar em conta a racionalidade de recursos. Entretanto, como observamos na prática que a luta por recursos se concentra em setores que justamente afastam a boa intenção da boa execução – leia-se: em nome da manutenção de altos cargos e da manutenção de uma cara (e geralmente ineficiente) burocracia, brada-se o aumento dos gastos como sendo sempre uma boa ideia, enquanto quem precisaria mais destes recursos costuma ficar sem ajuda –, é mais recomendável que as pessoas busquem realocar seus gastos ao longo do tempo separando ao menos uma pequena parte para seu “eu de amanhã” do que esperar que qualquer reforma que venha a seguir possa resolver a situação. Os mais jovens já estão pagando a conta da ausência de seriedade com o aspecto fiscal.

Este artigo não é um apelo para que você deixe sua rotina de lado, largue o trabalho e vá empreender para tentar transformar sua vida repentinamente – e nem algo parecido com isso. A ideia aqui é: racionalize desde já seu orçamento familiar porque, é triste te contar, mas esperar que o país possa te sustentar em sua famigerada “terceira idade” é cada vez mais ilusório – ao menos do modo como as coisas funcionam hoje em dia, principalmente se você estiver entre os 20 e os 40. Compensa mais observar seu orçamento doméstico e separar parte dele para o futuro do que imaginar que a situação melhore – reitero, mesmo em um cenário positivo em que todas as reformas passem.

Ah, um detalhe importante: aos que possam interpretar o texto acima como “então não é preciso que passemos por reformas, ufa!”, utilizo-me de uma frase de Armínio Fraga para explicitar meu pensamento:

“A ideia de que a opção se dá entre fazer ajustes ou ser feliz não existe. Ou o governo faz os ajustes necessários ou o país entra num buraco ainda mais profundo.”

 

Caio Augusto – Editor do Terraço Econômico

 

Notas

[1]          http://www1.folha.uol.com.br/tv/fla-flu/2016/08/1804805-fla-flu-sindicalista-e-economistas-divergem-sobre-reforma-da-previdencia.shtml

[2]          Só na saúde, em pesquisa recente (de 2014) tem-se o registro de uma desaprovação que supera 80%: http://www.estadao.com.br/noticias/geral,pesquisa-mostra-que-93-desaprovam-os-servicos-de-saude,1546392

[3]          http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/2016/11/quase-40-dos-servidores-do-rj-receberao-o-salario-em-7-parcelas.html

[4]          http://epoca.globo.com/tempo/noticia/2016/10/receio-um-colapso-nos-servicos-nos-governos-estaduais-diz-marcos-lisboa.html

[5]          Eis o texto integral da PEC do teto de gastos (241 na Câmara e 55 no Senado): http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=8720E5E3ACC73564A7B10582BDF40639.proposicoesWebExterno2?codteor=1468431&filename=PEC+241/2016

[6]          Eis o texto integral da PEC da reforma previdenciária (287 na Câmara): http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1514097&filename=PEC+287/2016

[7]          http://www.valor.com.br/brasil/4797241/previdencia-transicao-sera-de-15-anos-para-homem-e-de-20-para-mulher

[8]          http://ipea.gov.br/agencia/images/stories/PDFs/TDs_Ipea_Cepal/tdcepal_010.pdf

[9]          http://www.valor.com.br/brasil/4047038/fmi-programas-como-bolsa-familia-reduziram-pobreza-nivel-historico

[10]        http://economia.estadao.com.br/noticias/geral,elite-estatal-ocupa6-das-10-profissoes-mais-bem-pagas,10000081214

 

Publicações deste artigo, que foi escrito em dezembro de 2016:

– Terraço Econômico (07/12/2016): http://terracoeconomico.com.br/sejamos-sinceros-e-melhor-nem-pensar-mais-em-aposentadoria

– Money Times (07/12/2016): http://www.moneytimes.com.br/sejamos-sinceros-e-melhor-nem-pensar-mais-em-aposentadoria

– ADVFN Brasil (07/12/2016): http://br.advfn.com/jornal/2016/12/sejamos-sinceros-e-melhor-nem-pensar-mais-em-aposentadoria

– Investing.com Brasil (08/12/2016): http://br.investing.com/analysis/sejamos-sinceros:-%C3%89-melhor-nem-pensar-mais-em-aposentadoria-200168849?preview_fp_admin_1234=this_is_1234