RENDA FIXA EM 2020: NÃO A ABANDONE POR COMPLETO!

Selic em 4,5%, com viés de manutenção ou mesmo ainda uma nova queda (talvez de 25bps) antes de retomar o crescimento que, segundo o Boletim Focus mais recente, deve rumar nos próximos três anos a 6,5%. Em outras palavras: o paraíso brasileiro da renda fixa é cada vez mais uma realidade do passado.

“Fuja da renda fixa!!!”. Provavelmente você já leu ou ouviu essa frase diversas vezes nesse 2019. Mas o grande enigma nessa afirmação está no seguinte ponto: você conhece seu perfil de investidor para dizer qual o passo mais adequado a ser dado para fugir da renda fixa? E, além do mais, como diz a grande sabedoria de finanças, você “nunca deve deixar todos os ovos em uma cesta só”. Vale a pena tirar tudo da renda fixa e alocar em renda variável?

Pouco tempo atrás falamos aqui que você não deve abandonar de todo a poupança, basicamente porque ela serve ainda para despesas correntes – já que, no fim das contas, é um esforço não muito efetivo migrar esses recursos para outros que paguem IOF e IR dado o curto espaço de tempo que ficam na conta até serem destinados. Agora, vamos defender que você não abandone a renda fixa.

Todos os meses você recebe seus rendimentos (salário, alugueis, retirada de lucros etc) e, após pagar suas contas todas, se felizmente estiver no grupo dos brasileiros que consegue verificar que sobrou dinheiro, tem de fazer alguma coisa com ele. Neste caso, esse dinheiro que sobrou não necessariamente cairá bem para a poupança, já que os desembolsos do mês em teoria foram feitos e agora o dinheiro ficaria aguardando novas destinações.

Assim sendo, para onde direcionar esses recursos excedentes? É preciso olhar diretamente para onde estão as sobras de dinheiro dos meses anteriores.

Considerando que não sobre dinheiro em muitos períodos ou, quando sobre, seja numa quantia não muito elevada, o melhor a se fazer é procurar algum investimento em renda fixa que lhe dê mais tranquilidade financeira ao longo do tempo. Essa tranquilidade, no caso, é a de não ficar sempre preocupado com a pergunta “e se algo sair dos conformes neste mês?”.

Imagine que você tenha um total mensal de rendimentos de R$3000,00 e que suas contas mensais fiquem ao redor de R$2700,00 (já considerando aquela margem de segurança da qual falamos no artigo sobre não abandonar a poupança). Com esses R$300,00, supondo que você não tenha nenhuma reserva, é válido que você procure alguma alocação de renda fixa em que você possa manter seu dinheiro lá aguardando uma das duas situações a seguir.

A primeira delas é uma oportunidade positiva. Sabe aquela promoção de viagem que aparece inesperadamente e sugere ser uma grande oportunidade de viajar com sua família? Se você tiver algum recurso parado, pode ser essa a hora de utilizá-lo. A segunda, é uma ocorrência negativa. Você acordou, se arrumou, estava indo para o carro para mais um dia de trabalho quando descobre que ele não está ligando porque a bateria drenou. Caso você viva no limite de seu orçamento, pensar em uma bateria nova já lhe causará calafrios porque “vai faltar dinheiro no mês que vem”, mas se você tiver algum dinheiro parado em reserva, por mais que ninguém goste de desembolsar em situações ruins, basta pegar esses recursos, comprar a bateria nova e seguir com a vida.

No fim das contas, a renda fixa mantém, então, uma função primordial: a de conservar o valor do dinheiro excedente para o caso de oportunidades ou ocorrências inoportunas. Como a vida é cheia de idas e vindas – e eventos não programados, positivos e negativos -, convém você estar minimamente preparado para encarar uma praia ou mesmo uma ressaca do mar.

“Mas e se eu já tiver recursos em reserva e quiser algo com maior potencial de retorno? ”. Aí entramos em um campo mais sofisticado, o da renda variável. Fique atento ao próximo artigo desta coluna!

 

Publicado no blog da Guide Investimentos em 23/12/2019

Qual o resultado de 2019?

Desde 2016, após a entrada de Michel Temer, vivemos uma guinada reformista no Brasil. Não necessariamente as reformas ocorrem, mas o clima tornou-se mais propício para que venham a ocorrer. No primeiro ano de Jair Bolsonaro, tivemos uma continuidade dessa visão.

Sem dúvidas, a grande missão de 2019 em termos da articulação política foi a reforma previdenciária. Desde os tempos da transição de governos (os últimos dois meses de 2018), o assunto já se dava como prioridade para o ano seguinte. Entre idas e vindas, em novembro houve a promulgação da mais ampla reforma sobre este tema. Poderia ter sido mais robusta, por exemplo permitindo alteração futura de transferência solidária para capitalização e deixando para trás benefícios setoriais que permaneceram – e, em virtude disso, o sistema segue o mesmo, rumo ao colapso. Ainda assim, o impacto de alívio fiscal não é desprezível. Não é digno de comemoração, mas é possível respirar aliviado por uns instantes.

A conjuntura nacional de uma expectativa por uma breve aprovação desta reforma se transformou, ao longo do ano, em frustração do crescimento. No fim das contas, o lado fiscal do governo estando mais controlado permite que as expectativas dos agentes econômicos fiquem mais positivas e, disso, pode vir o crescimento. O atraso em demasia – e a preocupação por vezes incessante com temas pouco relevantes a essa vontade de reformar – ajudou a permitir que, pelo terceiro ano seguido, iniciássemos com previsões de crescimento muito superiores ao que acabou ocorrendo. Em 2019 iniciamos com previsões no entorno de 2,5% e, passado o ano, teremos visualizado crescimento nas proximidades de 1,0%.

Desemprego segue elevado. A recuperação deste aspecto ocorre, é verdade, mas ainda demonstra como a batalha será longa. Há geração de empregos a cada novo CAGED divulgado, mas ainda há uma quantidade imensa de brasileiros sem emprego. Com o crescimento ocorrendo nesta medida, é possível que em 2020 não tenhamos muitas novidades. Passamos o ano ao redor de 12% e, para o próximo ano, ainda devemos nos manter nos dois dígitos.

Inflação dá sinais de ter realmente ancorado, o que permitiu que a Selic se reduzisse ainda mais durante este ano. Para o primeiro item, as previsões indicam que fecharemos o ano na faixa entre 3,4 e 3,5% (um dos menores números da história). Em relação ao segundo, após a reunião do COPOM no início de novembro tivemos a redução da taxa Selic para 5% e esse ciclo de redução, espera-se, culminará numa taxa entre 4 e 4,25%, segundo condições atualmente observadas – o que é a menor taxa nominal de juros da história do país.

O cenário pós-reforma da previdência inclui discussões sobre tributos, o tamanho do Estado e também a respeito do desenvolvimento do país em aspectos do ambiente de negócios.

Contas públicas, como previsto no primeiro artigo desta coluna no ano, seguem no vermelho. Fizemos o que foi possível – podia ter sido melhor, mas isso fica para o ano que vem. 

Feliz 2020!

 

Artigo publicado na Revista da Associação Comercial e Industrial de Franca (ACIF-Franca)

SELIC A 4,5%: HORA DE ABANDONAR A POUPANÇA?

Durante essa semana tivemos mais uma queda na taxa básica de juros, a Selic. O Comitê de Política Monetária (COPOM) aplicou um novo corte de 50bps, fazendo com que ela esteja hoje em um patamar nominal nunca antes visto: 4,5% ao ano. Para se ter uma ideia do que isso significa, dois pontos são importantes: em primeiro lugar, há pouco mais de três anos nossa taxa Selic era de 14,25% (ficou nesse patamar entre 30/07/2015 e 19/10/2016); e segundo, a economia apenas com o pagamento de juros da dívida pública em 2020 será próxima de R$100 bilhões, segundo a equipe econômica.

Para além dos diversos aspectos positivos que ter uma taxa de juros mais próxima do que o mundo pratica nos traz, há um ponto que, caso você não esteja pensando ou se protegendo, certamente está perdendo dinheiro. Esse ponto é a alocação de seus recursos em reservas financeiras ou mesmo investimentos.

Com a Selic em 4,5%, a Poupança, que rende 70% dela, apresenta rendimento anual de 3,15% (o que é menor do que a inflação anual, que deve fechar 2019 entre 3,60~3,80%), um investimento que renda 100% do CDI e tenha desconto de imposto de renda terá rendimento aproximado a 3,71% e mesmo aquele bastante vantajoso 120% do CDI não dará nem 4,5% anualmente (encostará em 4,46%).

De posse das informações acima, é muito provável que o leitor já tenha lido em alguns lugares que “a atitude mais urgente a ser tomada é a de tirar todo seu dinheiro da poupança urgentemente”. A questão é de fato urgente, mas é preciso agir com sabedoria. No fim das contas, não é toda quantidade de recursos que deve ser tirada da poupança – pois há maior vantagem em manter nela os recursos de curto prazo do que buscar algo mais rentável, mesmo que tão conservador quanto.

O item mais falado quando o assunto é “o que existe de tão seguro quanto a poupança, mas renda mais do que ela” é o Tesouro Selic. Esse título da dívida pública brasileira lhe paga, como bem diz o nome, a Selic acumulada do período que você mantiver o título. Juntando o fato da Selic ser 4,5% e a Poupança agora render 3,15%, é lógico que você tire todos os seus recursos da velha conhecida Poupança e parta para a dívida pública nacional, certo? É aí que você precisa lembrar de dois detalhes importantíssimos: os impostos incidentes na operação e a necessidade de liquidez.

Tal qual a Poupança, o Tesouro Selic também apresenta liquidez diária, o que significa que você pode literalmente comprar ou vender em qualquer dia útil. Porém, o grande diferencial entre os dois meios de alocar seu dinheiro guardado, é que o primeiro apresenta rendimentos a cada mês e não incidem sobre esses rendimentos impostos (IOF ou IR) e o segundo apresenta rendimentos diários, mas sob a incidência desses impostos.

Partindo do pressuposto que você não conheça esses impostos, o mais importante a saber sobre eles é como eles incidem. O Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) incide sobre os primeiros trinta dias de uma aplicação (de maneira decrescente a cada dia, 96% no primeiro dia, 3% no 29º e depois zero) e o Imposto de Renda (IR) incide de maneira decrescente ao longo do tempo, mas sempre incide (22,5% até 180 dias, 20% de 181 a 360 dias, 17,5% de 361 a 720 dias e 15% acima de 721 dias). Existem outras peculiaridades a depender do fundo que você aplique também que valem ser observadas, como no caso dos Fundos de Ações em que o IR é sempre de 15%.

POIS BEM, ENTÃO COMO SABER O QUANTO DE RECURSOS FAZ SENTIDO AINDA DEIXAR NA POUPANÇA E O QUANTO DEVO ENVIAR PARA OUTROS TIPOS DE ALOCAÇÃO (CONSERVADORA OU NÃO)?

Imagine que suas entradas líquidas (salário, retiradas societárias, aluguéis,etc) totalizem R$5000,00 por mês e seus gastos mensais estejam nas proximidades de R$3500,00 (mas com variação possível de R$500,00 para mais, em determinados meses, podendo ocorrer ou não). Neste caso, seu fluxo de caixa livre está na faixa entre R$1000,00 e 1500,00. Levando em consideração que esses R$500,00 podem sair em qualquer um dos meses, é recomendável que esse valor fique em sua Poupança, enquanto os outros R$1000,00 podem ser alocados, por exemplo, no Tesouro Selic. Isso é o recomendável porque, no fim das contas, os R$500,00 colocados em um mês e retirados dentro desse mesmo mês praticamente empatarão em rendimentos na comparação entre Tesouro Selic e Poupança, dados os impostos pagos. Porém, há de se verificar uma diferença notável entre ambos conforme o tempo avança – e, assim sendo, os recursos que você não precisar mesmo usar no curto prazo ficarão melhor alocados no Tesouro Selic ou em alguma aplicação mais arrojada.

No fim das contas, tudo se relacionará com o controle que você exerce sobre suas próprias contas. É realmente assustador que a Poupança esteja literalmente te fazendo perder poder de compra (já que hoje rende menos do que a inflação), mas de nada adianta, nem em tempo, nem em esforço e muito menos em rendimentos, decidir que não se deve deixar nenhum centavo na Poupança simplesmente por existirem investimentos com rendimentos maiores – basicamente pela questão dos impostos incidentes.

Outra recomendação bastante importante e essencial em tempos de alarde sobre a urgência de tomar alguma atitude em relação a seu dinheiro guardado é a de conhecer seu próprio perfil de investidor (existem diversos testes online, é interessante pesquisar sobre para se conhecer). É tentador imaginar que com a bolsa decolando e a Selic em sua mínima histórica a melhor pedida seja migrar de uma vez para a renda variável – mas os riscos envolvidos precisam ser conhecidos (e sua reação a eles precisa ser estimada, para que um possível arrependimento não venha a ocorrer).

Dados de novembro de 2019 apontam que, hoje, R$825 bilhões estão depositados em contas de Poupança em nosso país. Certamente esse estoque vai se reduzir quanto mais o brasileiro médio se informar sobre o rendimento dessa velha conhecida – mas, como apresentado neste artigo, não é necessariamente a melhor medida que você transfira 100% de seus recursos ali disponíveis, a não ser que queira ter um esforço a mais para praticamente nenhum benefício adicional.

PRIVATIZARAM A ÁGUA no Terraço em Quinze Minutos #142

Nesta edição, Caio Augusto acompanha Paulo André e Rachel de Sá com os seguintes temas: Reconhecimento de vínculo trabalhista pode jogar água no chopp das empresas de transportes e facilidades, Posse presidencial na Argentina (sem representação plena do Brasil) e Novo marco do saneamento básico brasileiro. Leia os artigos do Terraço Econômico em: terracoeconomico.com.br

Link do episódio no Spotify

PRAGMATISMO COMERCIAL: COM A CHINA SIM, COM A ARGENTINA NÃO

Desde sua eleição, Jair Bolsonaro anunciou que o Brasil mudaria os rumos de sua política externa. Parafraseando-o, deixaríamos de nos alinhar com os países “esquerdistas” para enfim voltarmos a ter alinhamento com o mundo desenvolvido. Logo de cara houve um receio: isso significaria, então, que grandes parceiros comerciais seriam deixados de lado, como Argentina (caso voltasse aos tempos Kirchneristas, como de fato veio a ocorrer) e China (por seu sistema político)? Muitos industriais e interessados nas atuais parcerias tremeram por aguardar qual seria o desfecho.

No começo deste trimestre, o presidente realizou uma viagem ao oriente para tratar de, entre outros aspectos, as relações comerciais entre o Brasil e os países de lá. Era o momento de testar se o discurso de “vamos mudar isso daí” entraria em prática. Para surpresa de muitos, o que veio a acontecer foi algo bastante diverso: apesar de não ter assinado grandes acordos, a postura foi de aproximação e amizade, especialmente com a China. Para quem depende direta ou indiretamente dessas relações – e também para quem acredita mais em mercados do que em ideologias -, um resultado positivo. O pragmatismo com o país que nos permite ter um superávit comercial de quase US$25 bilhões apenas em 2019 é importante.

“Ufa, então nosso presidente entendeu a importância de estar alinhado com nossos parceiros comerciais! ”. É, muita calma nessa hora.

Nesta semana há a posse do novo presidente argentino, Alberto Fernández, e, devido a um encontro realizado na semana anterior desse recém-eleito presidente com o presidente da Câmara dos Deputados Rodrigo Maia (e também alguns parlamentares de partidos de esquerda), houve certa irritação gerada ao presidente brasileiro que, se desde a eleição já afirmava que não estaria presente na posse, agora desiste de ter qualquer presença no evento, deixando de enviar sequer um ministro para acompanhar o evento como representante do Brasil.

Ainda é muito cedo para afirmar que as relações estejam todas arranhadas e que seja impossível verificar avanços mais adiante. Porém, dois pontos são notáveis sobre essa atitude: em primeiro lugar, a Argentina é um importante parceiro comercial brasileiro – convém relembrar que o Mercosul foi iniciativa dos governos brasileiro e argentino da época; e, em segundo lugar, o recente acordo entre Mercosul e União Europeia, que ficou vinte anos em discussão, pode vir a ser desatado em virtude de discordâncias dentro do nosso próprio bloco, o que seria um retrocesso imenso.

As discussões sobre apoiar ou não os direcionamentos políticos de outros países são longa e não cabem em um curto artigo como este. Porém, algo que precisa estar em mente é que o impacto de “apoiar nações amigas” (como se fez em demasia nos governos anteriores a 2016) ou “apenas fazer alinhamento com quem é desenvolvido, mas não necessariamente é parceiro comercial” (como se tem feito ultimamente em aproximação quase sempre unilateral com os EUA) é praticamente o mesmo: perdemos tempo que poderia estar sendo dispensado em nutrir melhores relações com quem realmente nos faz avançar em termos comerciais.

Não se trata de deixar de lado quaisquer práticas que estejam sendo realizadas dentro dos respectivos países – como a repressão a movimentos que pedem por democracia (a China está fazendo isso com Hong Kong nesse exato momento) ou a retomada de medidas econômicas heterodoxas que já se provaram absolutamente ineficientes (a Argentina já anunciou que tomará esse caminho) -, mas sim de, em termos comerciais, não “desandar o caldo”, principalmente em um momento de, como se anuncia desde o momento da eleição, procurar encaixar nosso país nas cadeias globais de integração e geração de valor.

Em suma: é muito mais válido que procuremos como país o estabelecimento e manutenção de boas relações comerciais que nos sejam capazes de trazer divisas e gerar novos negócios do que perder tempo discutindo ideologias – porque, dessa maneira, a única coisa a se observar de mudança real é o espectro político apoiado.

 

Publicado no blog da Guide Investimentos em 09/12/2019