MAIS ESTADO RESOLVE A CRISE? Terraço em Quinze Minutos #85

Nesta edição, Lucas Goldstein acompanha Caio Augusto, Douglas Albuquerque e Victor Candido respondendo às suas perguntas:

1. jfmazzoni: “Gustavo Franco disse que vivemos uma primavera liberal. Concordam?”
1 1/2. michelstoco: “Por que liberais são tão questionados?”
2. _enrique_lacerda_: “CDB ou CDI?”
3. riquelme_august: “A intervenção do estado se faz necessária como em 1929 e 2008?”
4. diogopersilva: “Quais as dificuldades que Guedes poderá enfrentar no projeto de privatizações?”
5. gabrielbrumc: “Qual seu artigo econômico favorito?”

 

COMO A REFORMA DA PREVIDÊNCIA DEVE AFETAR SEUS INVESTIMENTOS?

Estabelecido há décadas, nosso sistema previdenciário passa a impressão de ser a garantia que todo brasileiro terá em sua velhice de ficar em situação tranquila. Tal situação, de depender exclusivamente da aposentadoria pública em seus dias dourados, já se mostra questionável nos dias atuais – basta ver como está quem depende apenas dessa aposentadoria para viver. Em tempos de tramitação de reforma, é mais uma vez válido lembrar que podemos fazer mais por nosso dinheiro para termos uma aposentadoria mais confortável.

Talvez o ponto que mais chame a atenção de quem se coloca como contrário a uma reforma previdenciária é o fato de que ela deve esticar o tempo de trabalho de um número de trabalhadores e, na prática, adiar o sonho da aposentadoria. Por mais curioso que isso pareça, esse aumento de tempo, se ocorrer com você, é uma oportunidade a mais para tornar seus últimos anos mais tranquilos. Como diz uma frase atribuída a Albert Einstein: “uma das maiores forças da natureza é a dos juros compostos”. Apesar de seu campo de conhecimento aprofundado ser outro, o gênio está correto também nesta afirmação.

Com a aprovação de uma ampla reforma previdenciária, o custo do governo para manter o sistema ativo como conhecemos se reduzirá nos próximos dez anos. Essa redução – que poderá ser do R$1,16 trilhão previsto no projeto inicial ou até cerca de metade disso -, além de deixar uma disponibilidade para outras aplicações (como saúde, educação e segurança) acabará permitindo que a taxa básica de juros da economia se estabilize em patamares próximos aos que vemos atualmente. Possivelmente, com tudo dando certo, podemos um dia no futuro deixarmos de ser “o país da renda fixa”.

No que isso impacta em seus investimentos? Tudo dependerá das expectativas futuras a respeito de questões fiscais – dentre elas, principalmente, a previdenciária.

No caso de termos uma robusta reforma aprovada, a estabilização gerada para a Selic deverá tornar investimentos em renda fixa menos atraentes do que historicamente o são. Mesmo o mais conservador dos investidores deverá olhar oportunidades melhores em termos de rendimento nos campos da renda variável e dos fundos de investimentos. Com a queda nas taxas básicas de juros, a chamada economia real tende a reagir mais no curto prazo e de maneira mais consistente ao longo do tempo.

Já em um cenário em que não se aprova reforma alguma (nem previdenciária nem nenhuma outra que possa impactar o fiscal aliviando-o), o cenário esperado para o futuro é de uma elevação ano a ano do custo do endividamento nacional, o que impacta diretamente na elevação da taxa básica de juros e na atratividade maior para os investimentos em renda fixa.

Voltando ao tópico inicial de ampliar os anos trabalhando: esteja atento a qual dos dois caminhos o país irá tomar, porque certamente com estes anos a mais de trabalho (caso seja essa sua situação se a reforma vier a ser aprovada), você terá anos a mais para investir no que deixará sua aposentadoria mais confortável.

 

Publicações deste artigo, que foi escrito em abril de 2019:

– Blog da Guide Investimentos (22/04/2019): https://blog.guide.com.br/textos/como-a-reforma-da-previdencia-deve-afetar-seus-investimentos/

BOLSODILMA RETURNS! Terraço em Quinze Minutos #83

Nesta edição, Lucas Goldstein acompanha Arthur Solow, Caio Augusto e Rachel de Sá com os seguintes temas:

Petrobras aumenta diesel em R$0,10 o litro
Dilmou de novo? DOIS BILHÕES de reais para caminhoneiros e estradas
PSOL e Centão empacam a CCJ e previdência fica para a semana que vem
STF ataca e proíbe a divulgação de reportagem contra Toffoli
Incêndio em Notre Dame: o que acontecerá daqui em diante?

Reforma da previdência: uma batalha de comunicação

Considerando o panorama de contas públicas em nosso país nos últimos anos, o tópico mais recorrente em discussão é a questão da reforma da previdência. Trata-se de um dos sistemas mais tradicionais dentro do mercado de trabalho em nosso país. Literalmente, gerações já iniciam sua carreira profissional pensando no tão sonhado dia em que irão se aposentar.

Dado o caráter praticamente petrificado desta estrutura, qualquer discussão a respeito de alterar esta expectativa logo recebe o direcionamento de ser uma “tentativa de acabar com sua aposentadoria”. Foi assim no segundo governo de Fernando Henrique Cardoso, no primeiro governo de Lula, quando Dilma ponderou sobre colocar uma idade mínima em seu primeiro mandato e durante o tempo de Temer.

Agora, com Bolsonaro, não seria diferente: o recém-iniciado governo de Bolsonaro, mesmo entre idas e vindas no que propôs até chegar na proposta final. Por um lado isso demonstra uma abertura maior a ouvir todas as partes, enquanto por outro sinaliza ou um despreparo a respeito do que vai ser oferecido (apesar das intenções de mudar consideravelmente a estrutura) ou mesmo uma discordância entre colocar para discussão uma reforma idealizada como Paulo Guedes pensa e colocar uma “que seja capaz de ser aprovada” (portanto, mais branda) como Jair Bolsonaro já mencionou.

As idas e vindas do que propõe essa reforma fazem com que este artigo torne-se obsoleto caso ouse enunciar alguns números, seja do que será possível economizar em uma janela de dez anos (já ouvimos entre R$1 bi e R$1,3), da janela de transição (poderia colocar a regra para valer a partir de 2022 ou passar 12 anos mudando) ou mesmo das idades mínimas propostas (que já foram de 62 e 57 ou mesmo 65 e 62 para homens e mulheres, respectivamente). Ainda assim, é preciso que sejam apresentadas as incoerências que tal reforma procura corrigir.

Primeiramente, a concentração de renda que ela gera. Hoje temos cerca de 30 milhões de aposentados pelo INSS e três milhões aposentados pelo regime de previdência pública. Proporcionalmente falando, este segundo grupo apresenta um déficit – diferença negativa entre recursos destinados ao pagamento das aposentadorias e o que é efetivamente pago – maior que o primeiro.

Em segundo lugar, a insustentabilidade do sistema. Atualmente, o sistema funciona pela chamada repartição de recursos: quem está trabalhando contribui para a aposentadoria de quem já está aposentado, não para a própria aposentadoria no futuro. Isso funcionava bem quando, nos anos 1980, tínhamos 9,2 pessoas em idade ativa para cada aposentado, segundo o IBGE – relação que hoje é de menos de cinco e, nas próximas décadas, rumará para menos de dois. Literalmente, a pirâmide se inverte e impossibilita o futuro do sistema como está. A mudança é urgente.

Finalmente em terceiro, mas não menos importante, as funções do Estado. Alguns advogam pela ideia de que mesmo que exista déficit previdenciário, ainda assim o sistema não deve ser alterado. Como essa despesa é crescente dado o envelhecimento populacional e que todo orçamento tem limite, essa escolha implica que outras áreas recebam menos recursos. Saúde, educação, segurança e outras políticas públicas ficarão ainda mais descobertas pelo curto cobertor orçamentário brasileiro.

Provavelmente você não pensava a respeito das questões elencadas neste artigo porque ouvia que essa reforma era apenas um jeito de “acabar com sua aposentadoria”. A má notícia é que enquanto essas ideias florescem, o sistema previdenciário segue rumo ao abismo – caminho que percorre há algumas décadas, não sendo algo iniciado agora.

A expectativa é que a equipe de Bolsonaro consiga mostrar a importância dessa reforma para que o apoio popular permita que seja aprovada. Ou então a narrativa que venceu nos últimos 20 anos sairá vencedora novamente – e o governo brasileiro virará apenas um enorme pagador de aposentadorias. A escolha está posta.

 

Publicações deste artigo, que foi escrito em fevereiro de 2019:

– Revista da Associação Comercial e Industrial de Franca (ACIF Franca), Edição 270, Página 48: http://www.acifranca.com.br/SITE/edicao/acif-em-revista-edicao270.html

COMO VOCÊ ESPERA ESTAR QUANDO SE APOSENTAR?

A pergunta que dá título a este artigo assusta ou afasta muita gente. Quando é tópico de alguma conversa, o assunto das finanças pessoais acaba trazendo em muitos de nós um certo receio, quando não mesmo medo ou desinteresse. Não precisava ser assim. Em tempos de rediscussão de previdência – havendo possibilidade de que algo tão esperado fique para mais adiante do que se esperava -, é importante retomar este assunto amargo para muitos.

Em termos de lidar com o dinheiro, existem três categorias nas quais você possa estar encaixado. A primeira e mais indesejável é estar em algum cadastro de negativados (realidade de quase 35% dos brasileiros). A segunda é não necessariamente estar negativado, mas não ter recursos em reserva (o que ocorre com 65% dos brasileiros). A terceira, mais confortável e desejada, é ter recursos reservados (22% estão enquadrados nessa categoria).

O caminho entre o dia de hoje, em que você lê este artigo, e o dia em que você deverá completar idade suficiente para se aposentar (seja pelo sistema previdenciário em que você se encaixa ou por ter conseguido juntar recursos pelo caminho) é composto pelo tempo que você tem para sair da primeira categoria e chegar à terceira. Fácil, realmente não é, principalmente porque envolve escolhas, mas é um meio de dizer ao seu “eu do futuro” que você se importa bastante com ele.

Considerando que você esteja entre a segunda e a terceira categoria, já conseguindo reservar recursos após ter resolvido ou controlado quaisquer dívidas que você tenha, a primeira pergunta que terá a fazer é: e agora, o que fazer com os recursos que sobraram? Basicamente neste momento que você precisa fazer a primeira grande escolha, que é a de manter sua estrutura de gastos apesar do dinheiro que sobra.

Após tomar esta primeira atitude, a pergunta sobre o que fazer com o dinheiro que sobra começa a ganhar contornos mais interessantes. Primeiramente, é recomendável que você faça uma reserva pessoal, que geralmente os especialistas indicam ser entre três e seis meses de despesas – reserva essa que deve estar em fundos de acesso imediato.

Em seguida, tendo essa reserva trabalhando pra você, é hora de procurar meios a curto, médio e longo prazo que possam permitir que o dinheiro trabalhe para você. Neste momento é importante descobrir qual seu perfil de investidor e alocar recursos no que mais se encaixam em suas reais necessidades ao longo do tempo.

Importante frisar novamente que não se trata de uma tarefa fácil. Um segredo que poucas vezes te contaram é que cuidar de dinheiro mais parece com os cuidados de um campo de grama do que com o observar de um bambu em sua crescente diária. Ou, mais diretamente: esteja mais atento a retornos acima de mercado ao longo do tempo do que a “oportunidades imperdíveis que vão te dar retornos inacreditáveis da noite pro dia”.

Felizmente, aqui na Guide você pode fazer de sua estadia na terceira categoria uma viagem bastante positiva ao redor do tempo, afinal, com os investimentos aqui oferecidos, seja você um investidor totalmente avesso aos riscos ou que os aprecie ao máximo, haverá sempre uma possibilidade de alocação. E, outro segredo que você nunca deve esquecer: Einstein dizia que uma das forças mais robustas era a dos juros compostos – se você aproveitar isso tendo o tempo como seu aliado, garanto que não irá se arrepender dos resultados (e seu eu do futuro será muito grato por isso).

 

Publicações deste artigo, que foi escrito em abril de 2019:

– Blog da Guide Investimentos (15/04/2019): https://blog.guide.com.br/textos/como-voce-espera-estar-quando-se-aposentar/

AVIANCA E O PERIGO DO CONCENTRADO MERCADO AÉREO BRASILEIRO

Em dezembro de 2018, a Avianca, empresa que apresentava crescimento e boa avaliação por seus passageiros, anunciou que entrava em regime de recuperação judicial – que é, em termos práticos, uma última tentativa de recuperar as atividades antes que ocorra uma falência, protegendo o crédito do devedor e procurando restabelecer os rumos da companhia.

Este processo de recuperação judicial envolve também as empresas que fizeram leasingdas aeronaves para a Avianca, naturalmente. De acordo com um tratado internacional, esse tipo de empresa deveria ficar fora de processos assim a fim de permitir que, em até trinta dias, ou a dívida existente seja paga ou os bens (no caso, as aeronaves) sejam devolvidas. Mas, por uma liminar concedida que objetiva manter as atividades da empresa, essas empresas foram colocadas na negociação também – o que adiciona um problema ao todo: as ações judiciais delas para mudar essa situação.

mercado aéreo brasileiro é bastante concentrado. Existe um número considerável de empresas, mas, segundo os dados de participação de mercado da ANAC, 86,99% dos passageiros estão voando em apenas quatro empresas aéreas: Latam (29%), Gol (28,39%), Azul (19,18%) e Avianca (10,42%). Não fica difícil imaginar o quanto as primeiras três empresas têm se beneficiado dessa recuperação judicial em termos de ampliar seus mercados.

Não é novidade para quem se utiliza dos serviços aéreos no Brasil que, além de concentrado, esse mercado é geralmente ineficiente – tanto que oferece serviços de qualidade questionável a preços razoavelmente altos e ainda assim se verificam notícias a respeito da dificuldade financeira delas. Essa eficiência deve melhorar com a permissão da entrada de empresas com capital 100% estrangeiro – e elas já estão chegando para, a um preço mais baixo, oferecerem uma interligação maior que amplie a capilaridade do sistema aéreo brasileiro.

Voltemos à Avianca. Seu grande pecado foi atuar de maneira muito arriscada em termos gerenciais – não que ampliar o mercado em momentos de crise seja má ideia, mas o fazer de modo próximo ao limite operacional (ampliando o que oferecia ao consumidor, mas ao custo de um aumento de dívida de maneira vertiginosa). O pedido de recuperação judicial seria uma tentativa de reverter a situação, mas, por ora, o cenário encontrado é bastante instável.

Este caso é mais uma demonstração do paradoxal resultado da concentração de mercados: os poucos players ficam com boa parte do mercado e, por uma certa acomodação com tal situação, esquecem-se (porque, afinal de contas, não vale a pena) de se atentar à eficiência dos processos e, no fim das contas, amargam os próprios prejuízos.

O remédio é amargo no curto prazo e gera reclamação principalmente de quem não se prepara quando tem a chance: chama-se competição.

 

Publicações deste artigo, que foi escrito em abril de 2019:

– Blog da Guide Investimentos (12/04/2019): https://blog.guide.com.br/textos/avianca-e-o-perigo-do-concentrado-mercado-aereo-brasileiro/

ANOS 2010: DÉCADA MAIS QUE PERDIDA

Segundo estudo recente do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV), teremos nos anos 2010 o pior crescimento médio de PIB em 120 anos. Caso você tenha ouvido falar nos últimos anos que esta seria uma “década perdida”, tal qual se atribui aos anos 1980, é hora de confirmar tal expectativa. Essa será a década mais “perdida” em mais de um século.

Há uma miríade de razões que explicam esse resultado e, na prática, seria pouco pertinente apontar apenas uma ou duas para resumir toda a questão. Porém, todo esse conjunto de medidas tem um nome: descaso com o longo prazo.

Nosso campo de políticas públicas, tanto à direita quanto à esquerda, sempre foi repleto de preocupações com causas que não costumam afetar tanto o longo prazo. Na dúvida, basta olharmos três dados alarmantes que nos colocam em posição vergonhosa.

Metade da população brasileira não tem acesso a saneamento básico. Esse tipo de problema, que poderíamos imaginar no século XIX mas é altamente preocupante que seja um dado dos dias recentes, contribui para a continuidade de doenças contagiosas e a difícil batalha de enxugamento de gelo que é a de todos os anos com os desembolsos públicos na saúde.

Menos de 10% dos brasileiros consegue entender bem o que lhe é dito e se expressar adequadamente. Este número surreal mostra como é fácil de entender que nosso atoleiro econômico não tem solução fácil: a partir deste dado podemos depreender, por exemplo, a ocorrência em diversos setores da existência de vagas que não são preenchidas porque não se têm candidatos preparados em número e qualificação suficiente.

Dos quase 200 países analisados em termos de facilidade de fazer negócios, estamos na segunda centena. Burocracia, dificuldades diversas e uma quantidade inominável de imbróglios e embaraços tornam a atividade empreendedora quase um sinal de heroísmo por aqui.

Provavelmente o leitor deve lembrar agora também de nosso problema com as contas públicas, que tem nos trazido a uma situação de aumento de carga tributária e dívida pública ano após ano – com exceção aos anos 2000, em que a China impulsionava bastante nossa economia e os superávits do período nos permitiram aliviar essa trajetória sensivelmente (o que inclusive deu a ilusão de que, já que os problemas estavam todos resolvidos e o sol brilhava, não era preciso trocar o telhado que já dava sinais de estar bastante desgastado). Ou ainda do nosso descuido quase que sempre presente em termos de nossa produtividade (que está estagnada há décadas).

Tudo isso culminou no pior biênio em termos de PIB da história do país (2015-2016) e, conhecemos agora, na pior década em 120 anos.

O que não faltam são motivos para explicar o porquê desse resultado tão ruim. A única notícia boa disso tudo, é que, quando estamos em uma situação muito negativa, há muitos exemplos bons a replicar para que o bom resultado volte a ocorrer. Ou então, que aceitemos que a realidade é ficarmos presos no tempo em termos de renda.

 

Publicações deste artigo, que foi escrito em abril de 2019:

– Blog da Guide Investimentos (03/04/2019): https://blog.guide.com.br/textos/anos-2010-decada-mais-que-perdida/