TÁ CHOVENDO PODCAST no Terraço em Quinze Minutos #95

Nesta edição, Lucas Goldstein acompanha Caio Augusto, Paulo André e Pedro Lula Mota respondendo às perguntas dos seguidores do Instagram:

@daniel.ortolani – “Bolsonaro está perdendo tempo com coisas inúteis?”
@joyceapg – “Guedes fica até o fim do mandato?”
@beladalpozzo e @brandaovictor – “O que é esse negócio de conta em dólares? Quais as vantagens e possibilidades?”
@igorchornobai – “Existe algum livro “bala de prata” para aprender economia numa leitura só? Se não, por onde começar a estudar?”

ESPECIAL ENEF: REGRA 50-35-15 – ORGANIZANDO O ORÇAMENTO PESSOAL

Dentro do campo das finanças pessoais, uma das grandes dúvidas que paira sobre a mente de quem deseja organizar melhor suas contas é como direcionar o dinheiro que entra para que, no fim das contas, sobre recurso a ser poupado/guardado/investido. Ou seja, organizar o orçamento pessoal.

Considerando inicialmente que seu orçamento consiga cobrir todas as suas despesas – e a recomendação clássica de Warren Buffet de que você não deve guardar o que sobra após os gastos, mas sim gastar o que sobra após seus investimentos -, uma regra razoavelmente simples ajuda a organizar o dia a dia financeiro.

Essa regra delimita que você divida seu orçamento em três grupos de destinações. Em 50% estariam alocados todos os seus desembolsos obrigatórios, dos quais você não pode deixar de fazer porque tornariam inviáveis sua vida ou seu trabalho. 35% seria a fatia de seu orçamento sob a qual cortes poderiam ser efetuados, gastos que estão envolvidos com seu estilo de vida. 15% pertence ao seu eu do futuro, são as “despesas” financeiras, o quanto você deve alocar para ter um futuro mais confortável.

primeiro passo para colocar essa regra em prática é levantar com a maior exatidão possível quais são suas receitas e despesas. Inicialmente, coloque-as todas “na mesa” para, em seguida, atribuir a elas a destinação adequada.

Com altas chances, de imediato você perceberá que seus gastos não se encaixam nesta regra. Provavelmente seu 50% é muito maior e talvez seu 15% não exista.

É neste momento que a regra se torna mais interessante em sua aplicação, porque há a consciência de que ajustes podem ser feitos. Tudo que você nomeou como obrigatório é mesmo obrigatório ou poderia se reduzir? Aquela assinatura de TV a cabo que você quase nunca assiste, aquele plano de celular muito acima do que você usa… Olhando com cuidado, quase sempre há o que reduzir.

Enquanto você reduz, surge o espaço para os 15%. A maioria dos brasileiros têm esse item nas proximidades de zero. Que tal utilizar a estratégia de colocar você mesmo como uma despesa futura? Assim, haverá menor sensação de “não está sobrando nada”. Coloque-se como uma obrigação sua.

Quanto aos 35%, o lembrete: não adianta enxugar seus gastos obrigatórios para seu eu do futuro e não viver o presente.

Provavelmente o leitor terá dores de cabeça após ler este artigo. É normal que aconteça – e positivo, porque indica que alguma atitude será tomada. Busque colocar esta regra em ação e veja, ao longo do tempo, como a preocupação com suas finanças pessoais se tornará mais algo bom a se lembrar do que um pesadelo.

 

Publicações deste artigo, que foi escrito em maio de 2019:

– Blog da Guide Investimentos (22/05/2019): https://blog.guide.com.br/textos/especial-enef-regra-50-35-15-organizando-o-orcamento-pessoal/

ACABOU O DINHEIRO no Terraço e Quinze Minutos #91

Nesta edição, Lucas Goldstein acompanha Caio Augusto e Paulo André respondendo às perguntas dos seguidores do Instagram:

@keytonsouza: há alguma fonte que é possível fazer cortes que não seja a educação?
@herbetgomes: O protesto de ontem teve a ver com educação ou foi de puro caráter político?
@fegasparetto: Até quando deve durar o pão com ovo que está essa bolsa em maio?
@leoobx: Bitcoin, expectativas futuras?

Os quatro itens principais na hora de investir

Provavelmente você já ouviu por aí a frase “o que o banco te oferece é bom pra ele, não pra você”. Em muitos casos, é verdade: as metas internas dos bancos em relação a lucratividade e ao mix de produtos financeiros oferecidos levam em consideração os objetivos de aumento de eficiência do banco, não do que o produto em si oferecerá ao cliente. Ainda assim, isso por si só não significa que qualquer coisa que uma corretora te oferecer será positivo também. É preciso que sejam observados alguns aspectos antes de colocar seu dinheiro em algum investimento.

Tendo isso em mente, fica a pergunta: o que então devo olhar quando for fazer um investimento? Tenha a maior informação possível dos quatro próximos itens e você reduzirá bastante seu risco de fazer um investimento que te decepcione.

Retorno. A expressão “esse produto rende muito” não é válida se não acompanhar um comparativo ou ao menos um guia de referência. Rende muito do quê? Geralmente esse guia é o CDI, que é a taxa de empréstimos interbancários, sempre próxima da Selic (que é nossa taxa básica de juros). Saiba qual o rendimento esperado antes de aportar recursos, para não dizer depois que se arrepende dos resultados alcançados mesmo se forem exatamente iguais aos que você contratou.

Tipo de investimento. Em se tratando de renda fixa, tipo de investimento em que o dinheiro aportado será devolvido com correção, os retornos serão pré-fixados (uma taxa combinada ao início, como por exemplo “7% ao ano”) ou pós-fixados (um percentual de algo, geralmente o CDI, sendo pago ao redor do tempo, como por exemplo “110% do CDI”). Em se tratando de renda variável, que é aquela em que o recurso aportado pode aumentar ou reduzir de valor, os retornos apresentados são passados – tome cuidado com possíveis casos em que quem está te oferecendo assume que “vai seguir sempre assim”, porque renda variável, como já diz o título, pode subir ou descer (portanto, o risco é maior, esteja ciente disso antes de entrar neste investimento). Se seu perfil de risco for mais arrojado e você suporta perdas de curto prazo, renda variável terá um espaço em sua carteira; se não, a renda fixa será seu lugar preferido de alocação.

Prazo de resgate. Considerando que você já tenha uma reserva de emergência que consiga suprir suas necessidades por alguns poucos meses em casos extraordinários, é hora de decidir sobre o tempo de resgate dos investimentos. Aqui, são basicamente duas as categorias: a dos investimentos de liquidez diária (que podem ser resgatados em qualquer dia útil após os aportes) e os que não tem liquidez diária (não são imediatos para resgate). Esse ponto é importante mas, de vez em quando, esquecido: é possível que a “ótima oportunidade” que estejam te oferecendo envolva “congelar” seu dinheiro por seis meses. Esteja atento a isso, pois pode resultar em dor de cabeça: se precisar de recursos no curto prazo, aplique mais em liquidez diária e, se puder esperar mais (ou seja, não precisar usar aquele recurso no curto prazo), aloque nos resgates mais longos. Pelo risco e custo do dinheiro no tempo, prazos mais longos tendem a remunerar mais.

Custos. Apenas em histórias mágicas fazer um investimento não resulta em custo algum. Em todos os outros casos da realidade, existem no mínimo três: os impostos, as taxas operacionais e o custo de oportunidade. Quanto aos impostos, dois estarão quase sempre presentes: o IOF (imposto sobre operações financeiras, que dura até o último dia do primeiro mês da aplicação e é decrescente) e o IR (imposto de renda, que também é decrescente, mas não zera e sua menor alíquota ocorre apenas após dois anos de investimento). Em relação a taxas de operação, existe um grande grupo delas, que podem envolver a performance do fundo, o carregamento, a manutenção, etc. Esteja pronto para perguntar sobre isso – mesmo que o gerente de seu banco esteja muito pouco disposto a te apresentar, já que essa é a parte mais desanimadora e que ele menos espera que você fique pensando. O custo de oportunidade é a resposta da pergunta “se não estivesse neste investimento, quanto meu dinheiro poderia estar rendendo em outro?”; quanto mais clara a resposta dessa pergunta, menor o arrependimento possível com um investimento de longo prazo.

Especialmente quanto aos impostos, as duas tabelas regressivas abaixo, do IOF e do IR, ajudam bastante. Lembrando que esses percentuais são o que você pagará sobre os rendimentos, não sobre o capital todo aplicado:

Na prática, como você deve proceder diante de uma oferta de investimento? Fique com esses quatro pontos na mente e, quando oferecida tal oportunidade, pergunte sobre os quatro. Não fique apenas no “este fundo Ultra Mega Blaster do Banco XYZ é excelente, confie em mim”, opte por perguntar o quanto ele rende (historicamente ou a porcentagem do CDI), que tipo de investimento ele é (renda fixa ou variável), por quanto tempo seu dinheiro ficará com a instituição (se você pode retirar os recursos a qualquer momento ou em quanto tempo pode fazer isso) e quanto custa a operação (impostos e todas as taxas é o que você perguntará ao banco e “que rendimento teria em outro lugar?” é o que você perguntará a si mesmo).

Com os dados de retorno e custos, você chega a um quinto ponto importante, que é o retorno real. De nada adianta ter um fundo magnífico de nome chamativo que renda 15% ao ano (o que é mais de 200% do CDI atual) se, entre impostos e taxas, você chegar a um rendimento real de 4,5% (próximo do que rendeu a poupança, o mais básico dos investimentos, no ano de 2018).

Informação é poder, principalmente em relação ao que você pode fazer pelo seu dinheiro. Sempre que receber uma proposta de investimento financeiro, não se esqueça de fazer essa breve análise de custo-benefício apresentada aqui. Outros fatores certamente pesarão mais sobre essa conta (como o custo de oportunidade do capital, no caso de um investimento produtivo), mas são basicamente esses quatro que farão a maior diferença ao longo do tempo.

 

Caio Augusto – Editor do Terraço Econômico

 

Publicações deste artigo, que foi escrito em maio de 2019:

– Terraço Econômico (16/05/2019): https://terracoeconomico.com.br/as-quatro-primordiais-coisas-a-verificar-quando-for-investir/

– Investing.com Brasil (17/05/2019): https://br.investing.com/analysis/os-quatro-itens-principais-na-hora-de-investir-200226211?preview_fp_admin_1234=this_is_1234

Mensalidade em universidade pública para quem pode pagar: ideia de como fazer

Uma das ideias que mais divide opiniões e está novamente em voga nos últimos tempos é a de permitir ou não que sejam cobradas mensalidades/anuidades de quem tem capacidade de pagar em universidades públicas. Como isso seria realizado em termos práticos? Neste artigo, uma singela sugestão é dada para que o debate saia do quase sempre presente “é difícil demais para fazer” ou “tem que cortar por cortar, é um absurdo o Estado custear tudo isso”.

Utilizando das Diretrizes Orçamentárias da USP para 2019, vamos aos dados do que se espera arrecadar e do que se tem de desembolso previsto para este ano. A receita esperada é de R$ 5.699.549.507, enquanto as despesas somam R$ 5.699.343.665. A maior parte da receita vem da participação de ICMS paulista que a universidade recebe e a maior destinação das despesas é com pessoal.

Deixando de lado como as alocações são feitas internamente e qual o perfil médio dos alunos que se utilizam dessa estrutura, retomemos o questionamento: como fazer essa cobrança?

Primeiramente, dever-se-ia separar os orçamentos de graduação, pesquisa e extensão. As universidades públicas paulistas (USP, Unesp e Unicamp) têm muitos alunos, mas o desembolso considerável (e importante) advém de sua pesquisa. Tendo dois orçamentos em separados, sendo um de pesquisa e extensão e outro de ensino, ficaria mais mensurável o retorno social dos investimentos públicos realizados. Na visão deste que aqui escreve, em uma ordem decrescente de prioridades, estão a pesquisa, a extensão e o ensino.

Considerando que já temos dois orçamentos em separado, ideal seria manter o custear da parte de pesquisa e extensão com os desembolsos públicos. Isso porque, assim como na educação básica, temos nestes dois pontos da tríade o maior retorno público – uma vez que, na prática, aquele que se utiliza do ensino de uma universidade pública de ponta acaba tendo mais benefícios privados (em sua própria vida e carreira profissional) do que públicos.

Quanto ao orçamento específico do ensino, quando do momento da entrada de novos alunos, exigir-se-ia uma nova apresentação: caso os provedores declarem imposto de renda, devem apresentar suas declarações dos últimos três anos antes da aprovação no vestibular. Dentro dessa declaração, o foco seria verificar qual a declaração de valor de desembolsos com educação do(a) filho(a) que acabou de ser aprovado. Caso superasse um limite mínimo, uma porcentagem desse valor seria a anuidade a ser paga.

Um exemplo numérico para ilustrar a ideia. Imagine que os pais do aluno Roberto pagaram para ele, nos três anos de ensino médio, mensalidades de R$1000,00 (totalizando “anuidade” de R$12.000,00). Vamos imaginar também outros dois alunos: a Bruna, cujos pais pagaram nos três anos do ensino médio uma mensalidade de R$2000,00 (totalizando “anuidade” de R$24.000,00) e o João, que fez o ensino médio em escola privada, mas com bolsa parcial, tendo pago R$500,00 por mês (totalizando uma “anuidade” de R$6.000,00).

Supondo um “nível mínimo” de R$10.000,00 de declaração no Imposto de Renda e uma porcentagem de 70%, João teria acesso integralmente custeado pelo desembolso público, Roberto pagaria uma anuidade de R$8400,00 (mensalidades de R$700,00) e Bruna pagaria uma anuidade de R$16.800,00 (mensalidades de R$1400,00).

É importante salientar que isso não excluiria a necessidade do Estado seguir financiando essas universidades, mas tornaria o sistema socialmente mais justo, porque quem tem capacidade financeira de pagar (através de critérios objetivamente observados) o faria. Possivelmente haveria incentivo para uma declaração destes valores de desembolsos com educação no Imposto de Renda como inferiores aos dados reais, mas é notoriamente sabido que um dos sistemas mais interligados (e, portanto, difíceis de serem ludibriados) é o da Receita Federal e, no fim das contas, essa atitude deliberada e por tanto tempo (ao menos três anos) geraria suspeitas.

Mais do que oferecer direcionamentos, o que este artigo pretende é apresentar que existe sim solução objetiva para tornar as universidades públicas socialmente mais justas sem que isso desequilibre a entrada de novos alunos e o andamento das atividades que mais apresentam retorno público (como pesquisa e extensão).

Inverter a lógica atual de investimentos educacionais públicos — concentração no ensino superior e pouco foco na educação básica/fundamental — não é tarefa fácil e não é algo que será feito da noite para o dia (ou em poucas canetadas, como tem se pretendido pelo atual Ministério da Educação). Mas, enquanto tal dominante prática não se equaliza, podemos aos poucos (e, isso sim, de maneira mais rápida do que se imagina) tornar o atual financiamento do ensino superior socialmente mais justo.

 

Caio Augusto — Editor do Terraço Econômico

 

Publicações deste artigo, que foi escrito em maio de 2019:

– Terraço Econômico (15/05/2019): https://terracoeconomico.com.br/mensalidade-em-universidade-publica-para-quem-pode-pagar-ideia-de-como-fazer/

SOMOS UM MILHÃO NA BOLSA: COMO CHEGAMOS E ONDE VAMOS?

Recentemente foi superada uma marca histórica no tocante ao investimento de ações no Brasil: agora temos mais de um milhão de pessoas em todo o território nacional capazes de realizar estes investimentos na Bolsa de Valores.

Dois contextos diferentes embasam o porquê dessa notícia ser simultaneamente positiva e desafiadora. O primeiro é o da taxa de juros baixa “encorajando” investimentos mais agressivos que possam apresentar um retorno maior e o segundo é o baixo nível de educação financeira em nosso país.

Estamos no menor nível nominal em nossa taxa básica de juros, a Selic, desde o final do primeiro trimestre de 2018. Chegamos aos 6,5% inicialmente com um olhar de que ele não se sustentará, mas nele estamos há mais de um ano sem muitas perspectivas de que torne a subir muito nos próximos tempos – segundo o Boletim Focus de 10 de maio, divulgado nesta última segunda-feira, a Selic deve chegar a 8% em 2022.

Na prática, isso é um atrativo para que o investidor procure alocar seus recursos em outras atividades porque uma coisa é superar ganhos de 6,5% ao ano, outra bem diferente é superar mais de 14% (como tivemos por aqui poucos anos atrás). Para dobrar o investimento, com taxa de juros em 6,5%, são necessários pouco mais de onze anos – enquanto a 14%, pouco mais de cinco anos bastam*. Mesmo os mais conservadores estão pensando na possibilidade de sair de investimentos mais básicos da renda fixa e, certamente, essa marca atingida de um milhão de CPFs tem relação com essa mudança. Essa diversificação maior de investimentos é positiva, porque torna mais amplos os meios de financiamento de projetos no país – seja por ações ou mesmo investimento em outros projetos produtivos.

O desafio presente está em permitir que estes que agora chegaram não só permaneçam investindo em ações como também recomendem a outras pessoas e as convidem para este tipo de investimento. Considerando o nível de educação financeira no país, a aceitação de conceitos básicos como “o valor pode subir ou cair” e o foco necessário no longo prazo (“aloque ali recursos que você espera crescer nos próximos anos, não necessariamente eles te deixarão financeiramente mais confortável ano que vem”) tendem a ser motivos de saída de muitas pessoas.

Em um momento de forte alta, é comum que muitos entrem no mercado. Porém, períodos de forte oscilação e negatividade tendem a assustar muitos. Por analogia, basta ver quais são as reações a aumentos ou reduções nos preços dos combustíveis: por mais que a oscilação ocorra pelo mesmo motivo para cima e para baixo, se quando os preços caem você não vê ninguém defendendo a liberdade de preços, quando sobem já fica fácil verificar protestos indignados. Com as ações, não é diferente: ter a consciência das altas e quedas de curto prazo evita decepções advindas do desconhecimento.

O primeiro grande teste é o período compreendido entre agora e a decisão – de aprovação ou não – da reforma previdenciária. Chegamos a um milhão, vejamos quanto os solavancos dos próximos tempos permitirão que este número se mantenha, aumente ou mesmo acabe por se reduzir.

*Cálculos realizados utilizando a Carteira de Juros Compostos, considerando valor inicial de R$100, sem aportes mensais e as taxas anuais de 6,5% e 14%.

 

Publicações deste artigo, que foi escrito em maio de 2019:

– Blog da Guide Investimentos (14/05/2019): https://blog.guide.com.br/textos/somos-um-milhao-na-bolsa-como-chegamos-e-onde-vamos/

O QUE DEVERÍAMOS TER APRENDIDO SOBRE DINHEIRO NA ESCOLA?

Educação financeira. Essa expressão costuma colocar medo em algumas pessoas. Pensa-se sempre ser algo distante da realidade, difícil de entender ou mesmo “coisa de quem já é rico”. Engana-se quem pensa em qualquer uma das três situações.

A educação é uma ferramenta fundamental de transformação da vida das pessoas. Isso porque ela, além de ser das únicas coisas que não se tira de uma pessoa (uma vez aprendido, o conhecimento estará sempre lá, aguardando para ser usado), muda a pessoa do status de “possivelmente vítima de uma desinformação” para “consciente de suas possibilidades”.

Educação se aprende na escola. Hoje se questiona muito sobre o que deveríamos aprender e o que estamos aprendendo de fato. Na opinião deste que vos escreve, quatro coisas seriam muito interessantes, em termos básicos: matemática, português (focando na interpretação de textos), finanças pessoais e economia. Matemática e português porque dão uma base para qualquer profissão, um início para se chegar a uma especialização maior demanda boa formação em ambas. Finanças pessoais para se deixar de cair em armadilhas do caminho quando o assunto é dinheiro. E economia para entender melhor a lei da oferta e da demanda – e cair menos em promessas políticas/governamentais que querem oferecer mudanças rápidas bagunçando este já complexo equilíbrio.

Especificamente em relação a dinheiro, seria interessante que se ensinassem a nossas crianças e jovens alguns pontos que fazem muita diferença.

O primeiro deles: saber que orçamento tem limite (e esse limite é o quanto se entra, não o quanto se tem de crédito). Há uma confusão imensa entre o real tamanho do que “se tem para utilizar”. Os bancos geralmente colocam direto no extrato nomes graciosos como “crédito especial” e, em alguns casos, abusam da desinformação colocando esse “dinheiro especialmente concedido aos amados clientes” acima do saldo (como se aquela quantia fizesse parte do que se tem de dinheiro na conta).

O segundo deles: mostrar que priorizar os gastos (tentando sempre deixá-los abaixo do que se recebe efetivamente) vale a pena. Essa responsabilidade pode começar com o famigerado “supermercado de brincadeira”, que algumas escolas têm colocado em prática e ensinado sobre a importância de direcionar corretamente o orçamento. Onde se tem essa experiência, geralmente as crianças começam gastando todo o dinheiro com guloseimas e, após um tempo, entendem que o que é fundamental (arroz, feijão, carnes…) deve vir primeiro.

Em terceiro e último, mas não menos importante: o que são os juros e como eles representam o custo do dinheiro no tempo. Geralmente os juros são tidos como “a causa raiz dos problemas financeiros”. Na realidade, eles são ou “o custo de antecipar o consumo futuro” (se você estiver pagando) ou “o parceiro ao longo dos anos rumo a liberdade financeira” (caso você esteja recebendo seus frutos).

Possivelmente especialistas em finanças pessoais têm muitas outras sugestões. Mas, a nível do que em termos mais básicos poderia se aprender – e mudar de verdade a vida das pessoas -, estes três pontos são primordiais.

 

Publicações deste artigo, que foi escrito em maio de 2019:

– Blog da Guide Investimentos (10/05/2019):https://blog.guide.com.br/textos/como-a-reforma-da-previdencia-deve-afetar-seus-investimentos/

Lições financeiras e não-financeiras do filme “Curtindo a Vida Adoidado”

Definitivamente um clássico da Sessão da Tarde. Se você nunca viu, veja na mais próxima oportunidade que tiver. É um filme tão interessante e cheio de detalhes que mesmo os spoilers aqui dados não tiram a graça e a emoção de assisti-lo. De 1986, mas definitivamente, atemporal.

O filme se inicia com um estudante de ensino médio chamado Ferris Bueller (interpretado por Matthew Broderick) mostrando como faz para faltar a uma aula. Ele finge estar doente e, quando seus pais e irmã saem de casa, sai com seus amigos para aproveitar o dia. Logo de cara uma das frases mais reflexivas sobre a vida vem: “A vida passa rápido demais; e se você não parar de vez em quando para vivê-la, acaba perdendo seu tempo”. De cara, quebrando a quarta parede, você já começa o filme pensando sobre sua própria vida.

O melhor amigo de Ferris Bueller é Cameron Frye (interpretado por Alan Ruck). Desanimado com a vida – e tendo faltado naquele dia por estar realmente doente -, recebe uma ligação de Bueller pedindo que venha aproveitar com ele aquele belo dia. Inicialmente recusa o convite do amigo, mas no fim das contas acaba participando do passeio sem rumo definido. Sloane Peterson (interpretada por Mia Sara) é o que chamamos hoje de crush de Bueller e, sob o pretexto de que sua avó faleceu, também é dispensada das aulas do dia e se junta aos outros dois.

Muito se passa no filme que mostra uma possível aventura inconsequente de três adolescentes que davam a entender que não queriam saber de nada da vida. Porém, as mensagens sutis – quase todas dadas em momentos de direcionamento de Bueller a quem está assistindo – mostram que a filosofia ali contida é muito mais ampla do que se imagina ser de um “simples” clássico da Sessão da Tarde.

Ferris Bueller é filho de um casal de classe média dos EUA que tem boa condição econômica. Em uma realidade na qual universidades têm um alto preço anual, ele comentar que “após o final do ano vamos para a faculdade” é um demonstrativo disso. Desta condição razoável de seus pais podemos depreender que, assim como já recomendamos aqui na coluna, se você tiver condições, vale a pena ir aos poucos reservando parte de tudo que ganha para ter uma vida mais confortável ao longo do tempo. Ao contrário deste casal, Bueller representa o imediatismo, o “viva agora”.

Um erro de tradução do título em inglês deixa escapar uma questão importante. Em português, “Curtindo a Vida Adoidado” dá a ideia de que esse dia especial tratado no filme é uma realidade cotidiana, enquanto o título original, “Ferris Bueller’s Day Off” (em tradução literal, “O dia de férias de Ferris Bueller”), já mostra mais diretamente que trata-se de uma ocasião mais pontual do que cotidiana (embora, no filme, mostre que ele tenha feito isso várias vezes naquele ano). Sendo um dia (e não toda a vida), nos mostra algo essencial, que é o de realmente aproveitar situações com sua família e amigos, mesmo que inesperadas, porque a vida passa muito rápido e podemos nos arrepender de não termos feito isso.

Há uma frase atribuída a Warren Buffet que diz que “se há alguém hoje sentado à sombra de uma árvore, é porque alguém plantou essa árvore muito tempo atrás”. Trata-se de uma sabedoria correta. No filme, se não os pais de Bueller (e também dos outros dois jovens), os avós fizeram esse plantio da árvore sobre os quais ele(s) se senta(m). Mas, complementando humildemente a visão deste que é um dos indivíduos mais ricos do planeta, digo que se a árvore está plantada, não há razão para que não se aproveite a sombra embaixo dela para observar a natureza ao redor.

O grande laço do filme é seu final, que… Falei que não ia comprometer com spoilers e não vou, indico que você assista. Mas a mensagem global do filme é que, apesar de termos de lidar com todas as preocupações do dia a dia, não podemos deixar de lado oportunidades de rever aqueles que amamos e nos amam.

É com esse desafio entre a prazerosa interação com quem gostamos e o cumprimento de nossas obrigações diárias que o filme nos deixa. A primeira parte desejamos muito que ocorra, mas passa muito rápido (assim como no filme); a segunda, pode ser muitas vezes cansativa e tensa. Fica no colo de quem o assiste, se o fizer com esse olhar mais atento, o que se está fazendo com a própria vida. O bom, velho e complicado equilíbrio entre vida pessoal e trabalho (que hoje é bem mais complexo do que na época do filme).

Você deve estar pensando: mas e se sou eu o responsável pelo plantio da árvore que vai gerar a sombra para as próximas gerações? Ainda assim a mensagem é válida. De nada valerá ter plantado uma frondosa árvore se, no processo de cuidados até ela ter se tornado deste modo, você tiver fechado os olhos a todos os dias em que o sol nasceu, brilhou e se foi.

Afinal:

“A vida passa rápido demais; e se você não parar de vez em quando para vivê-la, acaba perdendo seu tempo.”

Caio Augusto – Editor do Terraço Econômico

Artigo dedicado ao meu grande amigo e irmão Pedro Henrique Lopes, falecido no dia 06/05/2019 e que tantas vezes em sua vida serviu como o Ferris Bueller deste Cameron Frye que aqui escreve com frequência.

 

Publicações deste artigo, que foi escrito em maio de 2019:

– Terraço Econômico (09/05/2019): https://terracoeconomico.com.br/licoes-financeiras-e-nao-financeiras-do-filme-curtindo-a-vida-adoidado/

Não confunda mudar o futuro financeiro com se sufocar no caminho

Nesta coluna que trata de assuntos correlatos a finanças pessoais e como você pode se beneficiar se colocar em prática, até então abordamos que deve ser feito um esforço para que o futuro financeiro seja mais confortável e, na prática, isso significa que escolhas deverão ser feitas no caminho para que isso seja de fato possível. Porém, assim como os antigos sábios diziam, “tudo que é demais é prejudicial” e, poupar o presente deixando para utilizar no futuro, em demasia, também é prejudicial. Sempre busque o equilíbrio.

Dentro das estatísticas que levantamos aqui em outros artigos você já sabe que boa parte do Brasil se encontra alocado nos grupos interseccionados de pessoas que estão com crédito negativado e indivíduos que não possuem reserva financeira alguma. No grupo menor de pessoas que têm reservas financeiras, temos um subgrupo pequeno – mas que você certamente conhece alguém que se encaixa -, que é o de pessoas que deixam oportunidades passarem adiante basicamente porque elas afetariam sua renda ou seu nível de gastos.

O primeiro dos casos desse grupo é mais complicado. Aquela pessoa que detesta o trabalho em que está atualmente mas, pelas necessidades do dia a dia (e também pelos planos financeiros que deseja executar), não busca mudar de emprego basicamente porque isso alteraria sua renda mensal. Em um momento como o atual, em que o mercado de trabalho está bem complicado, é mais compreensível que isso ocorra. Mas mesmo em momentos de economia em alta e uma mobilidade maior como possibilidade, ainda assim vemos esse cidadão presente. Resultados disso, ao longo do tempo, envolvem o desgaste físico e mental da pessoa – e, nunca se esqueça disso, sem saúde não adianta nada ter um belo patrimônio. Muitas pessoas tornam-se reféns de suas dívidas ou do estilo de vida que vivem, colocando a flexibilidade na tomada de decisões da vida em xeque.

O segundo caso é mais presente e paradoxal na nossa sociedade brasileira. Sempre se ouve por aí que o brasileiro é um povo empreendedor, que tem ideias inovadoras e coloca em prática planos que “até a NASA devia vir estudar”. Mas, piadas à parte, uma verdade é que cavalos selados costumam passar diante de nossos olhos e, para não aumentar os desembolsos (mesmo que temporariamente), decidimos que outra pessoa aproveitará a viagem. Esse é o caso de ver aquela oportunidade, aquela demanda não cumprida que você sem muito esforço (mas com algum gasto/investimento) supriria, mas “desse jeito não vou conseguir poupar o que planejei”. Uma recente medida do governo pode ajudar nessa tomada de decisão: caso seja aprovada, a MP da Liberdade Econômica reduzirá a burocracia dos pequenos negócios – e facilitará a execução de várias ideias que hoje estão nas mentes.

Parafraseando Leandro Karnal em uma de suas palestras, “não é porque estou falando que casamento é complicado que você deve se divorciar”. Não leve ao pé da letra o que você lê neste artigo, chegando em casa hoje e dizendo “vou largar meu emprego para finalmente tentar trabalhar naquela empresa que sempre amei” ou “agora é hora de colocar todas as minhas reservas para fazer aquela pousada em Trancoso que sempre pensei em fazer”. Tudo depende do momento em que você se encontra e da viabilidade de colocar em prática esses projetos.

Porém, fica a reflexão, que muitas vezes é realizada em relação a aspectos mais gerais da vida, mas que perfeitamente consegue se encaixar se o assunto for dinheiro: com que frequência deixa de aproveitar oportunidades mesmo tendo dinheiro para isso? É justo consigo mesmo poupar todo seu presente em prol do futuro? Qual é o limite entre melhorar o futuro e desgastar o presente?

Todas essas perguntas têm respostas abertas e particulares, longe de ser um consenso. Procure sempre adaptar as suas finanças para que você consiga ter segurança para tomar decisões que realmente sejam positivas na sua vida. Ter um estilo de vida coerente com a renda, poupar e estar preparado para conseguir abraçar as oportunidades são pontos que minimizam riscos nas tomadas de decisão e criam alicerces para dar passos para frente.

Ter liberdade de poder escrever o seu futuro com aquilo que realmente gosta tende a trazer mais valor a sua vida do que viver em um marasmo de secar gelo todos os dias e reclamar dia sim e dia sim.

Cada escolha gera uma renúncia. Levante os pontos positivos e negativos de cada escolha, pense nos riscos e pergunte a si mesmo se você tem disposição  de assumi-lo.

O que se tem de recomendação média dentre os especialistas em finanças pessoais é que você reserve cerca de 10% de seu orçamento para seu eu de amanhã. Ainda assim, é válido sempre reavaliar o que você abre mão pelo seu futuro financeiro.

Caio Augusto – Editor do Terraço Econômico

Douglas Albuquerque – Editor do Terraço Econômico

 

Publicações deste artigo, que foi escrito em maio de 2019:

– Terraço Econômico (03/05/2019): https://terracoeconomico.com.br/nao-confunda-mudar-o-futuro-financeiro-com-se-sufocar-no-caminho/?fbclid=IwAR0lokUW0eqyA647453t_mmcNjJjku2Ly_kRX8jza2fu3AFev0W1ByqaMUo

– Investing.com Brasil (07/05/2019): https://br.investing.com/analysis/nao-confunda-mudar-o-futuro-financeiro-com-se-sufocar-no-caminho-200226035?preview_fp_admin_1234=this_is_1234

Reforma previdenciária: necessária, mas não suficiente

No foco das discussões legislativas recentes, como em outros momentos, está a discussão da reforma previdenciária. Argumentos embasados em dados, alguns embasados em ilusões e outros em pura politicagem estão por todo lugar, tanto para justificar que é preciso tomar alguma atitude quanto para sugerir que nada precisa ser feito quanto a isso.

Um ponto pouco discutido, ou, melhor dizendo, apenas passado adiante como sendo verdadeiro, é que o país verá verdadeira decolagem rumo a um futuro glorioso imediatamente após a aprovação da reforma previdenciária. Duas visões complementares baseiam isso: primeiramente, uma imensa quantidade de investimentos produtivos estaria no gatilho, apenas aguardando tal aprovação, para entrar de imediato no Brasil; em segundo lugar, o fôlego dado ao lado fiscal seria tamanho que diversas questões brasileiras poderiam finalmente ser atacadas – investimentos seriam majorados em saúde, educação e saneamento básico, por exemplo.

Sobre o primeiro ponto: investe quem vê perspectiva de aumento de demanda em seu mercado, não porque “o governo está gastando menos”. A economia como um todo se deteriora ou avança em um agregado (e uma melhoria na renda do país é um incentivo claro a investir), é verdade, mas, setorialmente, o que sempre vai ditar as regras do como são feitos os novos projetos de investimento é qual a perspectiva de seu retorno. Outro fator importante que não deve ser esquecido é o fato de ainda termos péssimas condições para empreender no Brasil – basta olhar o Doing Business– e uma mudança na política fiscal, por si só, não irá mudar isso. E, cá pra nós, é bem fácil tirar uma quantia financeira imensa da cartola do que vê-la sendo colocada em prática.

Adsense

O segundo ponto trata do que ocorrerá com o “dinheiro excedente”. E aqui está uma das más notícias: a reforma da previdência é necessária mas não suficiente porque, mesmo se aprovada em sua integralidade (o que não deve acontecer), permitiria que saíssemos do vermelho nas contas públicas só no início do próximo mandato presidencial. Anualmente, temos tido déficits na faixa entre 100 e 200 bilhões de reais e, mesmo se a reforma fosse aprovada no instante em que você lê este artigo, não seria suficiente para equalizar a situação – não no curto prazo, como tem sido vendido.

Na dúvida, basta olhar os dados levantados pela Instituição Fiscal Independente do Senado Federal em sua edição de abril/2019:

Sobre os constantes déficits nas contas do governo, o gráfico abaixo é bastante ilustrativo.

Publicado em: https://blog.guide.com.br/textos/missao-impossivel-2019-deficit-fiscal-zero/

Antes que você vá compartilhar este artigo com seu grupo ideológico contrário a aprovação da reforma previdenciária comemorando – ou o vá fazer em seu grupo ideológico a favor, dizendo que nós do Terraço Econômico somos uns “comunistas” ou algo que o valha -, é muito importante notar uma coisa importantíssima: a reforma é sim necessária, disso não se deve ter muita dúvida, dado que ela ataca privilégios e dá sim fôlego fiscal ao país ao longo dos anos; porém, não se iluda que ela será uma panaceia, salvação da lavoura ou resolução de todos os problemas do país, principalmente se sua ideia for de que, imediatamente após ela, teremos dias dourados novamente. Isso simplesmente não irá acontecer.

Vender o longo prazo como sendo curto prazo é, ao contrário da série de acertos da equipe econômica atual, seu segundo enorme erro. O primeiro foi o de dizer que iríamos zerar o déficit fiscal em 2019 – o que, a não ser que algo bastante relevante, fora do radar e não recorrente ocorra, está longe de ser uma realidade.

 

Caio Augusto – Editor do Terraço Econômico

Arthur Solow – Editor do Terraço Econômico

 

Publicações deste artigo, que foi escrito em abril de 2019:

– Terraço Econômico (01/05/2019): https://terracoeconomico.com.br/reforma-previdenciaria-necessaria-mas-nao-suficiente/

– Investing.com Brasil (02/05/2019): https://br.investing.com/analysis/reforma-previdenciaria-necessaria-mas-nao-suficiente-200225983?preview_fp_admin_1234=this_is_1234

– Money Times (02/05/2019): https://moneytimes.com.br/reforma-previdenciaria-necessaria-mas-nao-suficiente/