FUNDOS IMOBILIÁRIOS: FIQUE DE OLHO

A recuperação da economia brasileira caminha a passos mais lentos do que muito se previu. Apesar de uma inflexão de uma queda ao redor de 8% no biênio 2015-2016, o crescimento ao redor de 1% nos dois anos seguintes e as previsões para que com esforço se alcance o mesmo patamar em 2019 parecem um tanto quanto desanimadoras. Não para o setor imobiliário – e, consequentemente, para o de fundos imobiliários.

Fundos de Investimento Imobiliário (ou FIIs) nada mais são do que grupos de pessoas cujo objetivo é o de investir em ativos imobiliários. Dado que os financiamentos imobiliários – ou mesmo contratos de locação – costumam ter certa estabilidade, garantias de pagamento e prazos mais alongados, este investimento sempre está presente, mas ganha ainda mais espaço como alternativa de alocação de recursos em momentos como o atual.

Dois fatores deixam claras as vantagens do momento atual para este setor: taxa de jurosbaixa e inflação ancorada e igualmente baixa.

O primeiro fator é a resposta para a liquidez existente também em outros mercados: com uma SELIC em patamares mais baixos (atualmente em 6,5%, com viés de baixa), quem investe deve buscar outras alternativas para o dinheiro que trabalha para si. Essas alternativas são bastante diversas, mas, considerando o crescimento no setor imobiliário após um rigoroso inverno, colocam os títulos associados aos imóveis em boa situação. Em números, o mercado que tem se reaquecido puxado por moradias populares e também pelo mercado de alto padrão, e tem previsão de crescimento entre 10 e 15% neste ano.

O segundo parece mais psicológico, mas é muito mais real do que se imagina. Inflaçãobaixa e com sinais fortes de permanência em baixos patamares significa, na prática, que o horizonte possível para a aquisição de um imóvel é menos nebuloso do que algum que envolva grandes variações inflacionárias. Auxiliam a fortalecer essa visão de estabilidade as reformas do lado fiscal do governo, dentre elas a previdência, que resultará em um menor custo de financiamento do governo -, e permitem que os juros permaneçam mais baixos dado que a inflação também ficará em um patamar menor. Isso sem falar na ocupação de capacidade ociosa, fator que não se recuperou totalmente do tombo dos anos 2015 e 2016, e que permite que ocorra crescimento sem necessariamente uma pressão sobre os preços.

A união entre os juros baixos e o horizonte mais suave no tocante a inflação são uma mistura que, apesar do marasmo econômico em que nos encontramos, permite um crescimento notável no mercado imobiliário como um todo, desde a aquisição de imóveis em si até os fundos de investimentos que se baseiam nessas transações e na confiança de que elas seguirão sendo bem-sucedidas ao longo dos próximos anos.

Em 2019, o IFIX, que é o Índice de Fundos de Investimento Imobiliário com uma carteira teórica de 92 fundos imobiliários, já subiu pouco mais de 11% em 2019. A tendência é que reduções na taxa SELIC potencializem ainda mais esse rendimento.

No mundo novo que se abre nos rumos de uma Selic consideravelmente baixa e com sinais ainda de queda estão uma miríade de investimentos. É interessante ficar de olho nos Fundos de Investimento Imobiliário porque, apesar da economia ainda não ter começado a avançar como vem se prevendo nos anos recentes, o setor imobiliário é a prova de que esse movimento de recuperação é notável e já começou. Antecipar o movimento de recuperação é, sem dúvidas, fazer mais pelo seu próprio dinheiro.

 

Publicado no Blog da Guide Investimentos em 23/07/2019

BOLSO IN USA!? Terraço em Quinze Minutos #109

Nesta edição, Lucas Goldstein acompanha Caio Augusto e Rachel de Sá respondendo às perguntas dos seguidores do Instagram:

ph_liima – Bolsonaro vai se reeleger?
leo_souzalss – Como a liberação do FGTS pode afetar o mercado imobiliário?
vagner_goo – Como essa tramitação do nosso possível novo “embaixador no cenário internacional?
_vitorpaiva – De acordo com o atual cenário brasileiro é melhor investir em renda fixa ou variável?

FGTS: O último a sair apague a luz – e use-o com responsabilidade

Assim como no governo Temer com a equipe capitaneada por Henrique Meirelles, o atual Ministro da Economia do governo Bolsonaro, Paulo Guedes, está para anunciar uma liberação de recursos do FGTS para saque em possibilidades além das atuais. Independente do valor que será liberado no fim das contas, há uma reflexão que deve ser feita por quem tiver recursos disponíveis: não faz sentido deixá-los como estão atualmente.

O Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, famoso FGTS, faz parte do famigerado grupo de ditos direitos inalienáveis do trabalhador. Em teoria, seu objetivo principal é o de fornecer uma salvaguarda ao trabalhador em tempos difíceis (como na ocasião de demissão), de auxílio para a realização de um sonho (como o de comprar a casa própria), ou então para a aposentadoria. Na prática, o FGTS é uma poupança realizada compulsória e mensalmente direto do salário de todo trabalhador registrado sob regime da CLT (no montante de 8% de seu salário), tendo como premissa que o Estado deve garantir que o trabalhador poupe uma parte de sua renda, que então ficará sob a tutela não própria, mas do Estado em si.

Como esperado, há grupos que apoiam de maneira ferrenha a existência do FGTS e outros que o encaram como apenas mais uma obrigatoriedade imposta ao trabalhador brasileiro, e ao próprio empregador – contribuindo assim para o aumento do chamado “custo Brasil”. Enquanto os primeiros defendem o fundo por sua contribuição à investimentos em habitação, saneamento básico e infraestrutura, críticos ao FGTS argumentam ser escolha do trabalhador o que fazer com seu salário, não havendo a necessidade da tutela do estado.

Para aqueles que vos falam, acreditamos ser muitas vezes do equilíbrio entre extremos que se encontra o segredo para boas políticas públicas. De acordo com uma pesquisa recente da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiros e de Capitais (Anbima), um total de 58% dos brasileiros não possuía nenhum investimento financeiro em agosto de 2018, dentre os quais apenas 9% tinham feito algum aporte financeiro ao longo do ano anterior. Dos 42% que não poupavam, 10% o faziam por escolha, declarando preferir viver o presente e se preocupar mais tarde com o futuro, enquanto 25% dizia poupar apenas quando sobra no final do mês.

É claro que há diversas famílias vivem no limite, sem conseguir poupar nem uma parcela mínima do orçamento mensal. Porém, a realidade é que o brasileiro poupa pouco, o que todos sabemos não ser positivo nem para a economia como um todo (que possui então uma baixa taxa para investimentos produtivos), nem para o próprio trabalhador, que deve ter uma reserva para cobrir potenciais emergências, e, claro, para quando não puder mais trabalhar.

E é essa realidade que ilustra o benefício de políticas públicas que estabeleçam uma forma de poupança compulsória em países como o Brasil, onde educação financeira ainda é infelizmente privilégio de poucos.

Porém, é importante destacar o outro lado da moeda guardada a sete chaves no FGTS – seu baixíssimo rendimento. Nos últimos anos, o rendimento das aplicações no FGTS tem sido superado não somente pela inflação, mas por investimentos dos mais simples, como a poupança. Mesmo sob as novas regras estabelecidas no ano passado, um trabalhador com o salário de R$1.500 ao mês teria um rendimento de apenas R$98 em um ano (com base no resultado do FGTS de 2015), valor superável por diversos investimentos de complexidade não tão elevada.

Desta forma, julgamos acertada a decisão do governo da liberação de parcela do FGTS ao trabalhador brasileiro, dado o momento de alta inadimplência, baixa atividade e reduzido consumo – e diante de regras de gerenciamento que levam a rendimentos particularmente baixos.

Porém, do ponto de vista do trabalhador (e leitor do Terraço Econômico), o que então fazer com esse dinheiro?

O que se indica a fazer dependerá do estágio em que você se encontra, dentre os que serão apresentados a seguir: endividado, sem dívidas e sem reserva de emergência, e, por último, com reserva e já presente no mundo dos investimentos.

Se você estiver endividado e, considerando que mesmo na mais baixa taxa básica de juros nominal (a famosa Selic, que está em 6,5% com tendência de cair ainda mais) ainda temos um custo de dívida de curto prazo (como a do cartão de crédito) em níveis astronômicos, quite ou abata o máximo de suas dívidas caras com esse recurso. Garanta suas noites mais tranquilas de sono com essa atitude responsável.

Caso você não tenha dívidas mas viva na situação de não ter reservas – e, assim, não ter de onde tirar recursos para o caso de alguma emergência –, a dica é começar a construir uma reserva de emergência. Segundo os especialistas em finanças pessoais, essa reserva deve ser capaz de suprir algum período entre três e seis meses de suas despesas, para o caso por exemplo de uma demissão ou, por qualquer outro motivo, apareça uma forte indisponibilidade financeira. O ideal é que os recursos dessa reserva estejam disponíveis a curto prazo. Em uma ordem de “melhor ideia”, temos a poupança, o CDB de um banco tradicional, o CDB/LCI/LCA de um banco menor ou mesmo o Tesouro Selic.

Não tendo dívidas, tendo uma reserva de emergências e já estando no mundo dos investimentos, dado que a taxa de juros está em baixa e com tendência de assim se manter ou até mesmo se reduzir, pesquise sobre meios alheios à renda fixa para conseguir ganhos mais robustos ao longo do tempo. Fundos de ações, carteiras de alocação inteligente, fundos imobiliários, fundos multimercado. Utilize esses recursos inesperados para reforçar o montante de dinheiro que trabalha para você.

Se tem uma única ideia que não é de fato produtiva para seus recursos passíveis de saque do FGTS é mantê-los onde estão. Seguimos no mesmo pensamento de nossoartigo anterior, que dá base a este: o último a sair apague a luz, faça bom proveito do dinheiro que pertence a você, certamente será mais adequado do que o que o governo faz por você com ele; ou, em outras palavras: você consegue fazer melhor do que os 3% anuais de “rendimento” que seu dinheiro tem parado neste clássico direito adquirido.

 

Rachel Borges de Sá e Caio Augusto, editores Terraço Econômico, assinam este artigo.

 

Artigo publicado no Terraço Econômico em 18/07/2019

Carta aberta a Ciro Gomes: deixe a esquerda respirar!

Caro Ciro,

Parabéns por sua atitude altiva diante da traição evidente de Tabata Amaral e demais parlamentares. Deve ser exatamente para isso mesmo que serve um partido político: ou se está com ele, ou necessariamente contra ele.

Comemore uma conquista importante: assim como Lula, você aos poucos vai conseguindo se transformar no partido que representa. O PDT será Ciro, Ciro será PDT. Ou concorda com o Ciro, ou passa pelo conselho de ética e sai. Sua grande vantagem em relação ao Lula é ser uma pessoa honesta mas, fora disso, vocês muito se parecem quando o assunto envolve renovação partidária – ela praticamente inexiste fora de suas figuras pessoais.

Faço aqui uma humilde previsão do que acontece após este momento. Partidos de centro-direita que buscaram neste tempo cercar parlamentares como Tabata Amaral acabarão trazendo-a. Pois é. As maiores representações do que seria a inovação na esquerda brasileira acabarão se juntando a tudo de mais tradicional e horrendo da política brasileira (segundo sua visão).

Provavelmente nesse momento você deve estar pensando que estou errado, que preciso estudar, que não tenho vivência política, etc. De fato, o senhor conhece muito mais dessa máquina de moer gente que eu. E é surpreendente que, conhecendo como você conhece, tenha contribuído para que tal decisão fosse tomada. Talvez essa breve carta nem chegue aos seus olhos. Mas como eu gostaria que chegasse.

A análise na comissão de ética no partido ocorrerá e, como já anunciado, a decisão sobre o que acontece deve sair mesmo daqui 60 dias. Acredito que ainda há tempo de discutir então se realmente há necessidade de expulsar membros do partido por este voto (ou mesmo pela confirmação no segundo turno da reforma previdenciária, em agosto).

Em todo caso, desde já afirmo: se seu objetivo é ser a única representação livre da esquerda (já que a que te ofusca está presa até segunda ordem), te digo que você conseguiu. Outro feito possível é ter colocado Bolsonaro (ou alguém que dele se aproxime) na presidência em 2022 – já que esquerda renovada e com propósito real mesmo, só depois disso e olhe lá.

Com a quase certeza de que não serei lido e muito menos respondido,

Caio.

 

Artigo publicado no Terraço Econômico em 18/07/2019

Artigo publicado também, com alterações leves, no Brazil Journal em 21/07/2019

Brasil e sua insegurança jurídica: como investir aqui?

Olhando para o curto prazo, o período compreendido entre a eleição de Jair Bolsonaro e os dias de hoje mostra uma certa reversão de expectativas no que tange ao crescimento da economia. Houve quem dissesse no último trimestre de 2018 que “o mínimo que o PIB cresce em 2019 é 3%”. Viramos o ano, mudanças estão sendo tocadas, mas a cada nova semana vemos no Boletim Focus uma redução nas expectativas para o crescimento em 2019. Em artigo anterior nesta coluna discutimos o porquê do Brasil ter dificuldades de crescimento – gasto e consumo, de curto prazo, estão estrangulados, enquanto a saída é de prazo maior e chama-se investimento. Neste, discutiremos outro aspecto que nos prende a um crescimento baixo: a insegurança jurídica.

Insegurança jurídica é um termo geralmente de ampla discussão e pouco alvo. Neste texto, definir-se-á como sendo a união entre o desrespeito a regras e contratos (pelos agentes sujeitos a eles) com a alteração intensa nas regras do jogo (por quem as organiza e coloca em prática). Em nosso país, esse fenômeno recorrente desincentiva novos investimentos. Vamos a alguns exemplos.

A empresa Rappi, um verdadeiro “delivery de tudo”, é um sucesso em grandes cidades. Serviço que permite que até compras de supermercado sejam feitas por alguém e entregues em sua casa. De um lado, uma praticidade a quem pode pagar por ela. De outro lado, uma oportunidade de fazer dinheiro por quem está precisando. Boa ideia, não? Aparentemente não para a prefeitura de São Paulo, que discute proibir o serviço de entregas que cobre – o que deixaria em situação bastante complicada a Rappi, que foi recentemente avaliada em US$2,5 bilhões pelo SoftBank. Se essa medida realmente vira realidade, a empresa passa a depender mais de lobby com a prefeitura do que de sua prestação de serviços para seguir em frente.

A Crocs, empresa de sapatos, passou por certos apuros recentemente com o Carf. A história beira ao surrealismo. Fiscais da Receita Federal, da Câmara de Comércio Exterior (Camex) e do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) se debruçaram sobre a indispensável pergunta: “Crocs é sandália de borracha ou sapato impermeável?”. O motivo: a depender do NCM em que se encaixasse, haveria uma tributação diferente. Detalhe importante: a empresa havia se formalizado com o NCM de tributação maior e estava sendo punida por isso – ao que, por certa racionalidade, o correto seria, caso confirmada a mudança para tributação menor, que fosse reembolsada no que pagou a mais. Outro detalhe: produtos retidos no porto de Santos enquanto não se resolveu. Quer mais insanidade? Esse caso ocorreu em 2016 e, no ano seguinte, outro auditor fiscal disse que, na verdade, estava correto o NCM inicial. Imagine quanto tempo se perdeu entre advogados e tributaristas enquanto se poderia ganhar pensando em estratégias comerciais.

Extintor ABC, Kit de Primeiros Socorros, Simulador de Auto-Escola… São inúmeros os casos de exigências que passam a ocorrer, depois desaparecem e deixam a ver navios quem minimamente espera por previsibilidade para investir ou fazer negócios. Isso sem falar em quando não ocorre também o questionamento de contratos feitos, assinados e estabelecidos – contrariando o que deveriam ser os contratos, verdadeiras leis entre as partes.

A insegurança jurídica é uma dificuldade que demora muito a ser revertida, está longe de ser questão de curto prazo e ajuda a exemplificar em termos práticos a clássica frase de Tom Jobim: “o Brasil não é para amadores”. Tenha certeza: crescemos menos que nossos pares em desenvolvimento, dentre outros motivos, por este.

 

Publicado originalmente na edição 272 (página 38) da Revista da Associação do Comércio e Indústria de Franca (ACIF)

Publicado também no Terraço Econômico, em 10/07/2019

Apoie a Reforma #4 no Terraço em Quinze Minutos #108

Lucas Goldstein, Caio Augusto e Paulo André entrevistam a economista Ana Carla Abrão, head do escritório da Oliver Wyman no Brasil, sobre a Reforma da Previdência, com as questões:

– É indiscutível que a desigualdade de gênero é um tema cada vez mais importante para a nossa sociedade. Em relação à essa questão na reforma da Previdência, observamos idades mínimas diferentes para homens e mulheres. Essa diferença se justifica? Como a reforma da previdência, no geral, impactaria as mulheres?

– Nosso país é cheio de peculiaridades regionais e profissões que demandam esforços diferentes (em termos intelectuais e de força física). Algumas críticas de se ter um regime nacional unificado vão nessa direção, das diferenças existentes. Ainda assim, as expectativas de vida ao nascer e ao completar 60 anos são, em todas as regiões do país, superiores ao que se pretende ter como idades mínimas. O que você acha da diferença dada para categorias (professores, militares)? Ela é socialmente justa?

– A ausência de Estados e Municípios tem um certo viés eleitoral – ninguém quer ficar com esse “peso” de ter aprovado uma reforma dessas consigo. Governadores e Prefeitos querem passar a bola para o Legislativo Federal, enquanto membros deste, querendo cargos no Executivo dos outros entes, também evitam tocar no assunto. Para você, qual a vantagem de ter um sistema unificado de previdência e qual o maior problema disso não vir a ocorrer?

– Quando atingimos idades avançadas, o cuidado com a saúde se torna cada vez mais importante. Paradoxalmente, os gastos previdenciários representam uma parcela cada vez maior do orçamento público e cuidar do idoso não significa apenas pagar aposentadorias. Como equalizar esse problema, considerando, por exemplo, que as mulheres vivem por mais tempo e estão sujeitas às problemas específicos de saúde nessa fase da vida?

REFORMAS SÃO O PAVIMENTO MELHOR, NÃO A CERTEZA DA CHEGADA

É absolutamente louvável que, em todo momento de discussão de reformas, coloque-se qualquer que seja a mudança pretendida como sendo a “salvação da lavoura”. Exageros são cometidos em nome da aprovação de algo complicado, amplo ou mesmo bastante impopular. Mas passada a ressaca da aprovação, é inegável o questionamento sobre os imediatos efeitos prometidos. E é nesse momento que a euforia vira desânimo e esse desânimo vira um sentimento de enganação.

REFORMA TRABALHISTA

Nos idos de 2017, discutia-se a necessidade evidente de atualização das normas trabalhistas brasileiras, essas que eram basicamente as mesmas desde a criação da CLT, na década de 1940. Alguns argumentavam que “um conjunto de regras da época do fascismo” não era mais atual e que as mudanças trariam milhões de empregos. Deixou-se de mencionar (muito provavelmente com intenção) que a real necessidade era para que fossem abarcadas na atual realidade profissões e modelos de trabalho que não existiam à época da criação da CLT e que, quanto à criação de empregos, as novas normas permitiam uma flexibilização que facilita a abertura de novos postos de trabalho em um momento de recuperação econômica – o que ainda não ocorreu, pelo menos não nos moldes anunciados.

REFORMA DA PREVIDÊNCIA

Ainda em tramitação, com resultados possíveis consideravelmente superiores ao que teríamos com o projeto do governo anterior, tal reforma é tida como o caminho pelo qual um novo país nascerá, já que quase um trilhão de reais serão economizados na próxima década. O que não se comenta tanto é que o efeito desse fôlego fiscal ocorre durante os dez anos, não no tempo imediato e que, para além dessa reforma, muito ainda terá de ser discutido sobre o tamanho (e o custo) do Estado em comparação com o PIB. Novamente, efeitos não imediatos.

Com a reforma da previdência em considerável avanço – a não ser que algo muito fora da curva ocorra, a veremos aprovada nos próximos meses -, discute-se agora a reforma tributária. Por ora, concorrem entre si projetos do Executivo e do Legislativo, fala-se na unificação de impostos, na redução de alíquotas para empresas e pessoas físicas e ainda em uma readequação do caráter regressivo (colocando maior peso sobre quem ganha mais e retirando parte do peso de quem ganha menos). Uma vez mais, como é de se esperar, é alardeado o efeito imediato de melhoria.

De fato, dentre as reformas aqui mencionadas, a que tem maior poder de fogo em curto prazo é mesmo a tributária. Facilitar o pagamento dos impostos, mesmo que não reduzindo a carga tributária, já nos faria melhorar bastante o ambiente de negócios. Ainda assim, é preciso ter em mente que reformas tornam a estrada mais transitável, mas não são necessariamente a causa que leva o passageiro ao seu destino.

Encarando com mais seriedade os efeitos reais das reformas, podemos discutir uma efetividade maior das mesmas, evitando arrependimentos ou abertura para que opositores digam a clássica frase “eu avisei que não daria certo”. Pensemos sobre isso nesse breve período do ano em que não se discutirão reformas por duas semanas, tendo em vista o recesso do legislativo brasileiro.

 

Publicado no Blog da Guide Investimentos em 16/07/2019

Apoie a Reforma #3 no Terraço em Quinze Minutos #107

Lucas Goldstein, Caio Augusto e Paulo André entrevistam a professora de direito do Mackenzie Zélia Pierdoná e o professor de economia da FEA-USP Hélio Zylberstajn sobre a Reforma da Previdência, com as questões:

– Há alguma questão que você considera desejável, mas, muito provavelmente ficará de fora da reforma? Qual seria a importância desse ponto?

– A reforma da Previdência está em pauta há décadas, contudo, hoje é tratada como uma medida urgente. Você pode indicar os principais fatores que nos trouxeram até essa situação?

– Quando falamos de Previdência, grosso modo, falamos de aposentadoria. Todavia, inúmeros economistas estrangeiros têm discutido o impacto socioeconômico da automação industrial, inteligência artificial e progresso tecnológico. Qual a visão de vocês a respeito disso? Corremos o risco de não aposentar no futuro porque profissões deixarão de existir? Há relação entre esse tema e o equacionamento do problema previdenciário?

– Uma das frases proferidas pelos opositores da reforma da Previdência é: “Trabalhar até morrer ou morrer de tanto trabalhar!” O que há de factual, se é que há, nessa frase?

REFORMA DA PREVIDÊNCIA: GOLAÇO, MAS O INFERNO ESTÁ NOS DESTAQUES

Uma vitória incontestável. Houve quem enumerasse 330 votos a favor da Reforma da Previdência, outros apontavam para números ao redor disso. A previsão era que ia passar, mas nem o mais otimista imaginaria o número de 379 votos favoráveis na primeira votação. Vitória tão emocionante que, logo após ela, fez chorar Rodrigo Maia, o presidente da Câmara dos Deputados.

Em termos gerais, teremos uma redução na despesa previdenciária mesmo após os destaques que deve ser superior ao que inicialmente se propunha no projeto de Temer. Na proposta do ex-presidente, inicialmente seriam cerca de 700 bilhões de reais de economia em dez anos que, após discussões e lapidamentos em comissões, se tornou algo pouco superior à metade disso. Com o atual presidente, o inicial era de R$ 1,27 trilhão e, após discussões, espera-se que tenhamos uma economia de pelo menos R$ 750 bilhões em uma década.

Com isso, o custo de financiamento do governo se reduz, ganhamos o chamado “fôlego fiscal”, que é na prática um tempo a mais para equalizarmos as contas e tentar fazer o setor público e suas atribuições caberem dentro do PIB. O termo “potência fiscal”, tão utilizado pelo Ministro Paulo Guedes, estava muito vinculado à economia de R$ 1 trilhão, que ficou mais difícil a partir da votação na Câmara.

Os destaques – que compõem o “inferno” do título do artigo – envolvem a manutenção de normas atualmente existentes ou a imposição de custos menores de transição. Os famosos “especiais” (grupos que têm força para se manifestar e, na maioria das vezes, dizem estar defendendo o interesse de quem não está ali) que reivindicam aposentadoria antecipada ou com maiores benefícios seguem presentes. De professores a policiais, grupos de interesse fazem suas pressões.

Dois detalhes ficaram fora do projeto e preocupam: a não possibilidade de discussão de capitalização no futuro e a não inclusão dos Estados e Municípios nesta Reforma.

Quanto ao primeiro ponto, a questão é simples e direta: vamos reduzir o gasto, mas o sistema é o mesmo (repartição) e, com toda certeza, precisaremos discutir essa áspera questão no futuro novamente. Podíamos ter aproveitado o apoio popular (e legislativo) agora para isso.

Já em relação ao segundo, trata-se de um adiamento de problema. O motivo: benevolentes como são, Estados e Municípios seguirão com seus planos de expansão de gastos (afinal, não terão que reformar previdência, que é a despesa gargalo na grande maioria dos entes subnacionais) e, quando a conta não fechar de novo, recorrerão à União. São mais de dois mil regimes próprios de previdência. Será um socorro imenso quando ocorrer.

Apesar dos pesares, um golaço. Nada de aguardar uma decisão “em cima da risca”, torcer pra nenhum Kandir não votar errado e nem Joesley Batista com áudio vazado quebrando o clima. Vitória acachapante que deve servir de pavimentação para as próximas reformas – e, quem sabe, para adequações à própria Nova Previdência com mais facilidade que outrora.

 

Publicado no blog da Guide Investimentos em 12/07/2019